Duas semanas após a realização simultânea de manifestações contra o governo Jair Bolsonaro em dezenas de cidades do país, apoiadores do presidente pretendem realizar uma grande motociata neste sábado (12/06) em São Paulo. Bolsonaro confirmou presença, em mais um evento que tende a gerar aglomeração em meio à pandemia de coronavírus.
O ato de São Paulo ganhou o nome de ‘Acelera para Cristo’, sendo promovido nas redes sociais como uma versão evangélica das motociatas bolsonaristas realizadas em maio em Brasília e Rio de Janeiro, onde não houve esse rótulo religioso.
Igrejas, porém, negam estar por trás da convocação. Quem batizou o evento com esse nome e se colocou como coordenador foi o comerciante evangélico Jackson Vilar, dono de uma loja de móveis no Capão Redondo, zona sul de São Paulo. Ele tem promovido intensamente o ato, inclusive com um cadastro online para sorteio de uma moto entre os que comparecerem à motociata e doarem um quilo de alimento.
Sua atuação, porém, irritou motoclubes que apoiam Bolsonaro e veem uma tentativa do comerciante em se aproveitar politicamente da mobilização. Em 2018, ele foi candidato a deputado federal, mas não conseguiu se eleger. Embora já apoiasse Bolsonaro, concorreu pelo Pros, que em 2018 estava coligado com o PT.
Em seu perfil no Facebook, o integrante do motoclube Força e União Juan Brey disse que a mobilização é “espontânea” e em “apoio incondicional” a Bolsonaro. “Não precisamos (de) organização nem puxadores, assim como aconteceu nas anteriores (em Brasília e no Rio). E lamentamos que tenha pessoas inescrupulosas querendo angariar popularidade e lucros político partidários”, criticou.
Em mais um sinal do alto investimento no evento, Jackson Vilar fez uma transmissão ao vivo na quarta-feira (9/6) enquanto sobrevoava uma parte do trajeto previsto para sábado.
“Vai compartilhando aí essa live aí que nós vamos mostrar agora onde vai ser a maior concentração de motos em São Paulo, sábado agora. O Acelera para Cristo, mais de 100 mil motos, vai dar lockdown em São Paulo. O (governador João) Dória vai me processar de novo”, disse Vilar, rindo de dentro do helicóptero.
Opositor ferrenho do governador de São Paulo e das medidas de isolamento social de sua gestão para reduzir o contágio do coronavírus, Vilar foi convocado a prestar depoimento à Polícia Civil em março após participar de um protesto em frente à casa de Doria. Segundo o governador, os manifestantes teriam ameaçado ele e sua família, o que os acusados negam.
À BBC News Brasil, o comerciante refutou que esteja buscando projeção política com a motociata. Segundo ele, o sorteio da moto busca estimular o cadastro dos interessados para ter uma estimativa dos participantes. Na quinta-feira de tarde, anunciou em um vídeo que já havia quase 300 mil inscritos.
Nas suas redes sociais, ele diz que o cadastro é indispensável para a participação. Afirma também que o levantamento foi solicitado pela segurança da Presidência da República. Entre as informações pedidas estão nome completo, CPF, email, celular e placa e modelo da moto.
A BBC News Brasil questionou o Palácio do Planalto e o Gabinete de Segurança Institucional se confirmavam a solicitação dos dados, mas não obteve retorno até a publicação da reportagem.
Em um grupo de Telegram com cerca de 2,3 mil participantes criado pelo próprio Vilar para divulgar o ato muitas pessoas se queixam de que o cadastro não estava funcionando e algumas suspeitavam da sua validade. “Eu acho que esse cadastro é furada, fora que ficam com nossos dados! Motociata sim! Cadastro não, tô fora!”, reclamou um dos participantes na quinta-feira (10/6).
Segundo a convocação do comerciante, a motociata sai do Sambódromo de São Paulo às 10h de sábado e percorrerá cerca de 120 km pela cidade até o local de encerramento, que foi transferido da Avenida Paulista para o Parque Ibirapuera. Ele próprio deixa claro na transmissão ao vivo que a mudança foi por divergência com outros grupos de apoiadores do presidente que já teriam reservado previamente espaço na Avenida Paulista para seus trio elétricos.
“Como tem gente querendo ser pai da criança. É uma falta de educação”, reclamou. “É impressionante, nós que estamos organizando o evento, na Avenida Paulista não tem um lugar pra mim pôr um trio elétrico pro presidente falar, para gente fazer um culto pra Jesus lá”, disse ainda, antes de entrar no helicóptero.