A quinta-feira (28) será marcada pela chegada de dois novos boletins importantes do USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) e, embora as expectativas para os novos números já estejam ventilando a algum tempo, surpresas podem sempre aparecer e impactar o andamento dos mercados. Entre os dados que serão reportados estão os dos estoques trimestrais na posição de 1º de março de 2024 e o de inteção de plantio para a safra 2024/25, no Prospective Plantings.
Embora os números dos estoques sejam bastante aguardados e tragam informações bastante relevantes para o caminhar dos preços nos próximos meses, os dados de área são as primeiras peças para o quebra-cabeças da safra 2024/25 global de grãos, com os primeiros sinais sobre as novas safras do Hemisfério Norte.
Assim, na espera destes números e do ambiente que criarão entre os produtores norte-americanos e para os preços, os mercado operam em compasso de espera nesta semana, ajustando suas posições antes dos relatórios.
O sentimento comum entre os analistas e consultores é de que o USDA traga um aumento na área de soja, ao passo em que milho e trigo deverão ter áreas menores na nova temporada. A questão agora é a intensidade deste aumento em relação à safra 2023/24, em relação ao atual momento das cotações e fazendo uma rápida relação com os últimos anos.
Para a a área de soja, as expectativas variam de 34,54 a 35,61 milhões de hectares, com média de 35,02 milhões. No Outlook Forum do USDA, em fevereiro, o número estimado foi de 35,41 milhões e no ano passado foram cultivados 33,83 milhões de hectares com a oleaginosa.
“Essa recuperação na área de soja dos EUA é um fator muito preocupante. Em 2018, quando se inicou a guerra comercial entre EUA e China, a China deixou de comprar soja americana e o produtor americano que deixou de plantar 36 milhões de hectares de soja – com estoques de 25 milhões de toneladas e preços baixos – reduziu a área em cinco milhões de hectares. Agora, para a safra 2024/25, as estimativas são de que a área seja de 35,4 milhões de hectares. Portanto, a área aumentando cinco milhões de hectares nestes últimos cinco anos, com uma produtividade média de 3 mil quilos por hectare, são 15 milhões de toneladas de soja a mais nos Estados Unidos – que é a referência para Chicago – e esse excedente causa um teto para Chicago, a não ser que uma ameaça climática apareça no radar, o que não está acontecendo agora”, explica Marcos Araújo, analista de mercado da Agrinvest Commodities.
Já para a área de milho, as expectativas do mercado variam de 36,42 a 37,83 milhões de hectares, com média das projeções em 37,14 milhões. Há um mês, no fórum, o USDA projetou 36,83 milhões e, no ano anterior, os EUA dedicaram 38,3 milhões de hectares à produção do cereal.
Esta mudança do milho para a soja pelo produtor dos Estados Unidos, explica Araújo, se explica pelo retorno financeiro projetado pelos produtores do país neste momento. São resultados positivos com a soja e negativos com o milho, ao menos por agora, avaliando o que os preços no mercado futuro na Bolsa de Chicago apontam atualmente.
“Considerando o perfil médio do produtor dos EUA, ele planta 46% em terra própria e 54% em terra arrendada, ele hoje lucra US$ 290,00 por hectare com a soja e perde US$ 30,00 com o milho”, detalha o analista, que reforça a necessidade do acompanhamento dos futuros da oleaginosa e do cereal em Chicago nas posições, respectivamente, novembro e dezembro. Nesta quarta-feira (27), são US$ 11,84 e o US$ 4,63 por bushel.
Para o trigo, o mercado espera algo entre 18,7 e 20,23 milhões de hectares, com média esperada em 19,15 milhões. No mês passado, o fórum apontou 19,02 milhões e, há um ano, foram 20,06 milhões de hectares plantados com o grão.
As expectativas estão postas, as projeções das consultorias privadas também, porém, tanto Araújo, como a especialista em commodities agrícolas Karen Braun afirmam que a área nos EUA é algo que tem sido bastante difícil de projetar nos últimos anos.
“As intenções de plantação dos agricultores têm sido notoriamente difíceis de prever nos últimos anos, e os preços das principais culturas estão muito mais baixos do que há um ano, em especial do período em que muitos produtores tomam decisões de plantio”, afirma Karen. “Os futuros do milho e da soja em Chicago dispararam este mês, mas os preços serão testados novamente na quinta-feira, quando o governo americano publicar suas estimativas de plantio baseadas em pesquisas, as quais são conhecidas por definir o tom para os mercados”.
O gráfico abaixo, de autoria da especialista internacional, aponta as relações entre os dois contratos – soja novembro e milho dezembro na CBOT – e sinaliza, no retângulo amarelo, o comportamento da relação em anos em que a área de milho veio acima das expectativas do mercado – o que aconteceu nos anos de 2016, 2019, 2020 e 2023.
“Áreas de milho muito maiores em relação às estimativas chegando quinta-feira podem prejudicar as chances de uma recuperação dos preços durante a primavera (nos EUA), especialmente porque grandes especuladores cobriram recentemente uma parte das suas posições vendidas”, explica Karen. “Mas, 2024 pode também não se enquadrar nos moldes de anos anteriores, em que as projeções de áreas menores se confirmaram nos EUA, ao menos neste boletim de março. Afinal, todos os anos em que as áreas de milho foram surpreendentemente grandes foram aqueles em que os preços do cereal estavam um pouco mais fortalecidos do que os da soja”, em especial nos momentos também de tomada de decisão pelos produtores norte-americanos.
Soma-se às análises atuais o fato de que os agricultores nos EUA são verdadeiros “apaixoandos” pelo milho e muito deles apostam em produtividades bastante elevadas podendo compensar ou seus custos mais elevados ou uma rentabilidade comprometida pelo preço de venda.
TENDÊNCIAS
A analista internacional lembra ainda que, nos últimos oito anos, a área de milho no país ficou por seis vezes foram dos intervalos de expectativas do mercado. Ao mesmo tempo, porém, em 15 anos, os números soja superaram as projeções apenas por três vezes – em 2014, 2017 e 2022. “E em 2022 nunca deveria ter acontecido, já que a área final ficou bem abaixo do registrado em março pelo USDA. E isso esteve, provavelmente, relacionado à área de milho superestimada no mesmo ano”.
MUDANÇAS
Os números que chegam nesta quinta-feira são, realmente, muito aguardados pelo mercado. Todavia, ainda mudarão bastante durante a safra que está prestes a começar nos Estados Unidos, também como explicam analistas e consultores de mercado.
“O USDA pode trazer um número alto agora para este relatório de março e depois fazer um corte grande no relatório de junho que é a segunda atualização nos números de área plantada. Já vimos isso acontecer e no ano passado”, afirma o diretor da Pátria Agronegócios, Cristiano Palavro. “E isso trouxe uma movimentação importante para o mercado. Em junho do ano passado tivemos as mínimas que foram revisitadas agora em fevereiro, e depois que foi cortada a área americana reagiu e reagiu bastante, voltando à casa dos US$ 14,00 (no ano passado), até acima dos US$ 14,00 nos contratos mais curtos”.
Assim, Palavro complementa dizendo que será fundamental entender e monitorar se o mercado vai fazer seus movimentos agora ou se os fará, em junho, quando a atualização vier. “Por isso, na nossa visão, esses números são ainda mais importantes do que o próprio relatório de estoques trimestrais”.
ESTOQUES TRIMESTRAIS
Os estoques trimestrais de soja dos EUA, em 1º de março de 2024, são esperados entre 47,36 e 54,05 milhões de toneladas, com média de 49,75 milhões. Há um ano, o número era de 45,91 milhões.
Já os estoques de milho poderão ficar entre 206,49 e 217,64 milhões de toneladas, com a média das expectativas em 214,06 milhões. Em março de 2023, o número era de 187,87 milhões.
As expectativas para o trigo, por sua vez, variam de 27,13 a 29,39 milhões de toneladas, com média de 28,41 milhões. No ano passado, neste mesmo período, os estoques do cereal eram de 25,61 milhões.