Um programa para a redução do uso de agrotóxicos no país, elaborado ainda no governo Dilma Roussef, pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, voltou à pauta neste ano e enfrenta resistência do Ministério da Agricultura. A Pasta tem divergências técnicas e políticas em relação ao Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pronara), o que fez o tema chegar ao Palácio do Planalto.
O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, convocou uma reunião nesta semana, após receber carta com críticas à posição da Agricultura, e precisou mediar um acordo com a Pasta comandada pelo ministro Carlos Fávaro para rever o veto dele ao programa em discussões preliminares.
O assunto foi “consensuado” em reunião realizada na terça-feira entre Lula, Fávaro, Paulo Teixeira (MDA), ministros palacianos e representantes do Meio Ambiente e Saúde, disseram duas fontes gabaritadas em Brasília.
Ficou acertado que o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo), que incluía a implementação do Pronara, será publicado em breve e trará um objetivo específico de “construir um programa de redução de uso de agrotóxicos”. O lançamento do Planapo foi adiado quatro vezes pelas discordâncias da Agricultura sobre os defensivos químicos.
A estratégia prevista é reduzir o uso daqueles com maior toxidade e perigo ao meio ambiente e ampliar investimentos em bioinsumos. O debate será ampliado para envolver todos os setores interessados, como especialistas, entidades do agronegócio e da agricultura familiar, saúde, meio ambiente e a indústria. A falta de “voz ativa” nas discussões do Pronara era uma das críticas dos fabricantes de agrotóxicos e do Ministério da Agricultura.
No mesmo dia, Lula disse que está disposto a conversar com a bancada ruralista sobre o tema e que ninguém será “pego de surpresa” com propostas enviadas na calada da noite ao Congresso.
“Não é possível que a gente não tome uma atitude com o crescimento da utilização de agrotóxico neste país. Vamos fazer uma proposta, vamos chamar as lideranças dos partidos, vamos chamar a Embrapa, vamos chamar os empresários e vamos discutir porque não é possível que 80% dos agrotóxicos proibidos na Alemanha possam ser vendidos no Brasil, como se fôssemos uma republiqueta de bananas”, disse Lula, na terça-feira.
Comissão
O Pronara foi elaborado em 2014, mas nunca foi lançado. Na época, o Ministério da Agricultura, comandado por Kátia Abreu, também barrou a implementação do programa. Em 2023, Lula reativou a Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (CNAPO). Formada por 14 ministérios e entidades governamentais e da sociedade civil, é responsável por revisar o programa.
A CNAPO está elaborando a terceira fase do Planapo. O primeiro anúncio havia sido programado para julho. Relatório da reunião da comissão daquele mês diz que o encontro foi marcado por discussões sobre esse adiamento, “o qual ocorreu devido à dificuldade de consenso sobre a permanência do objetivo específico que trata da implementação do Pronara”.
No dia 13, movimentos sociais e integrantes da CNAPO enviaram uma carta a Lula manifestando “repúdio à atitude do Ministério da Agricultura e Pecuária” sobre o veto da Pasta ao lançamento do Planapo, por conta do Pronara, e apelando pela intervenção direta do presidente na questão.
Os signatários expressaram “indignação” pela forma como o governo tem encaminhado a pauta da redução de agrotóxicos. Na carta, o grupo diz que o posicionamento da Agricultura “bloqueia a instituição do Pronara e fere profundamente o Estado Democrático de Direito”, já que o programa foi defendido pela participação popular.
Hoje, membros da CNAPO deverão ter uma resposta do governo à carta, em reunião agendada com o MDA e a Secretaria-Geral da Presidência. Rogério Dias, representante do Instituto Brasil Orgânico na comissão, disse que a situação ainda não está clara, mas que o objetivo de alertar o governo para a importância do tema foi alcançado.
Agroecologia e agronegócio
Paulo Petersen, representante da Articulação Nacional de Agroecologia, defendeu a versão original do Pronara e disse que o programa não prejudica o agronegócio. “Não estamos falando de abolição de agrotóxicos, não estamos falando de eliminação abrupta ou qualquer coisa que vá colocar em risco a produtividade do agronegócio, nada disso. Estamos falando que é possível reduzir drasticamente [o uso de agrotóxicos] sem comprometer a economia do agronegócio”, afirmou.