Em uma decisão unânime, os ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal votaram pela manutenção das condenações dos quatro réus responsabilizados pelo incêndio na Boate Kiss, ocorrido em 27 de janeiro de 2013, em Santa Maria, no Rio Grande do Sul. A tragédia deixou 242 mortos e mais de 600 feridos, sendo uma das maiores catástrofes já registradas em locais de entretenimento no Brasil.
O julgamento, realizado de forma virtual, contou com os votos do relator Dias Toffoli e dos ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin, Nunes Marques e André Mendonça. Todos eles rejeitaram os recursos apresentados pelas defesas, que buscavam anular as condenações ou ao menos reduzir as penas impostas pelo Tribunal do Júri.
Com isso, permanecem válidas as condenações dos ex-sócios da casa noturna Elissandro Callegaro Spohr, que recebeu pena de 22 anos e seis meses de prisão, e Mauro Londero Hoffmann, condenado a 19 anos e seis meses. Também foram mantidas as penas de 18 anos de prisão para Marcelo de Jesus dos Santos, vocalista da banda Gurizada Fandangueira, e Luciano Bonilha, produtor musical.
A tragédia aconteceu durante uma apresentação da banda, quando um dos músicos acendeu um artefato pirotécnico no palco. As faíscas atingiram a espuma de isolamento acústico no teto da boate, provocando um incêndio de rápida propagação. A fumaça tóxica tomou conta do ambiente em poucos minutos, deixando a maioria das vítimas sem chance de escapar. A boate estava superlotada e com falhas graves de segurança, incluindo a ausência de rotas de fuga adequadas, portas trancadas, iluminação de emergência insuficiente e extintores inoperantes.
Testemunhas relataram cenas de desespero, gritos e pessoas pisoteadas tentando sair do local. Muitas vítimas morreram asfixiadas pela fumaça densa, que continha gases altamente tóxicos liberados pela queima da espuma de isolamento acústico. Entre os mortos estavam jovens universitários, recém-formados, músicos, trabalhadores da boate e até bombeiros que tentaram ajudar.
Camila Farias, uma das sobreviventes, tinha 21 anos na época. Ela conta que ainda hoje sente o cheiro da fumaça. “Foi tudo muito rápido. Eu estava perto do palco e vi o fogo começando. Tentei correr, mas fui empurrada e caí. Só consegui sair porque alguém me puxou pelos braços”, lembra. Camila passou dias internada e hoje convive com sequelas respiratórias e emocionais.
Outro sobrevivente, o estudante Lucas Ramos, perdeu dois amigos naquela noite. “A gente só queria se divertir. Em minutos, tudo virou um inferno. Nunca vou esquecer os rostos das pessoas pedindo socorro. A gente saiu, mas ficou com o peso de quem não conseguiu”, relata.
Ao longo dos anos, o caso da Boate Kiss se tornou símbolo da luta por justiça das famílias das vítimas, que enfrentaram uma longa batalha judicial marcada por recursos, anulações e reviravoltas. A decisão do STF agora representa o encerramento de uma etapa crucial nesse processo, consolidando a responsabilização dos acusados e reforçando a importância da segurança em espaços públicos.
O relator, ministro Dias Toffoli, destacou que o Tribunal do Júri agiu dentro da legalidade e que não houve qualquer violação ao direito de defesa. Segundo ele, as provas reunidas ao longo do processo confirmam a negligência dos réus e a sua responsabilidade direta pela tragédia.
A cidade de Santa Maria, ainda marcada pela dor da perda, recebeu a notícia da confirmação das penas com um misto de alívio e tristeza. Familiares, sobreviventes e moradores esperam que o caso sirva como exemplo para evitar que novas tragédias aconteçam. Muitos mantêm viva a memória dos que partiram por meio de homenagens, projetos sociais e ações de conscientização.
Para a Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), a decisão do Supremo reforça que a justiça pode tardar, mas não deve falhar. “Essa decisão é para os nossos filhos, irmãos e amigos que não estão mais aqui. Lutamos por 11 anos para ver os culpados sendo responsabilizados. Não é um dia de comemoração, mas de dignidade”, declarou a presidente da associação, Flávia Moraes, que perdeu o filho de 20 anos no incêndio.
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