Mato Grosso do Sul, 27 de junho de 2025
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STF revê marco legal da internet e decide responsabilizar big techs por conteúdos ilícitos de terceiros

Tese jurídica inédita do Supremo aponta omissão legislativa e impõe novo dever de cuidado a plataformas digitais em casos de conteúdos graves
Imagem -  Cristiano Mariz
Imagem - Cristiano Mariz

Em uma decisão histórica que promete redefinir as fronteiras da liberdade digital e da responsabilidade civil na era das redes sociais, o Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria, nesta quinta-feira, 26 de junho, para estabelecer a responsabilização direta das chamadas big techs por conteúdos ilícitos publicados por terceiros em suas plataformas. Por 8 votos a 3, a Corte considerou parcialmente inconstitucional o artigo 19 do Marco Civil da Internet, em vigor desde 2014, e elaborou uma tese com novos parâmetros para a responsabilização civil das plataformas digitais no Brasil.

O novo entendimento jurídico do Supremo altera de forma significativa o regime de responsabilização que até então protegia as empresas de tecnologia de processos judiciais, salvo nos casos em que desobedecessem ordens judiciais para retirada de conteúdo. Agora, essas plataformas passam a ser responsabilizadas em situações envolvendo conteúdos de elevada gravidade como incitação à violência, crimes sexuais, atos antidemocráticos e discurso de ódio independentemente de decisão judicial prévia.

Ao declarar a mudança, o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, destacou que a Corte não está criando leis, mas exercendo sua função de guardiã da Constituição. “Estamos decidindo dois casos concretos e, a partir deles, estabelecendo critérios que devem prevalecer até que o Poder Legislativo regulamente de forma mais precisa a matéria”, afirmou Barroso durante a leitura da tese.

Alterações de grande impacto jurídico

A tese do STF estabelece que há uma lacuna no ordenamento jurídico um “estado de omissão parcial” no atual texto do artigo 19 do Marco Civil, que falha ao não conferir proteção adequada a direitos constitucionais essenciais, como a dignidade da pessoa humana, a honra, a liberdade e a proteção da democracia. Com isso, foi aberta a possibilidade de responsabilização das plataformas com base em novos critérios interpretativos até que o Congresso aprove uma legislação específica.

A nova interpretação jurídica considera que os provedores de aplicações de internet — redes sociais, plataformas de vídeo, marketplaces e similares — poderão ser responsabilizados civilmente em casos de crime ou atos ilícitos cometidos por usuários, mesmo quando não houver ordem judicial anterior. A exceção se aplica apenas a contextos regulados por normas específicas da Justiça Eleitoral ou por atos normativos do Tribunal Superior Eleitoral.

Análise técnica e perspectivas jurídicas

Para o advogado e professor de direito digital Rodrigo Vieira, a decisão do STF cria um novo marco de cautela para o setor. “O artigo 19 do Marco Civil blindava as plataformas da responsabilização direta, o que fazia sentido num contexto de neutralidade da rede. Mas o mundo mudou. Com redes automatizadas, impulsionamentos pagos e lucros vinculados à visibilidade de conteúdo, as big techs se tornaram, de fato, corresponsáveis pela difusão de danos online. O Supremo apenas adaptou a Constituição à realidade digital”, explica o jurista.

Já a professora de direito constitucional Luciana Lins destaca o caráter provisório da medida e os riscos de judicialização. “A decisão tem um viés protetivo, mas é necessário que o Congresso atue com urgência. Sem legislação clara, vamos assistir a uma enxurrada de ações judiciais baseadas em interpretações subjetivas sobre o que é ou não ‘conteúdo ilícito grave’”, alerta a especialista.

Critérios definidos pelo Supremo

O STF definiu que plataformas digitais serão responsabilizadas especialmente nos seguintes casos:

  • Conteúdos impulsionados ou patrocinados por anúncios pagos;
  • Postagens disseminadas por redes artificiais de contas automatizadas (bots);
  • Falhas sistêmicas na adoção de medidas preventivas ou de remoção de conteúdos manifestamente ilícitos;
  • Casos em que marketplaces funcionem como fornecedores diretos, regidos pelo Código de Defesa do Consumidor.

Em todas essas hipóteses, a exclusão da responsabilidade civil dependerá da comprovação, por parte da empresa, de que adotou “medidas diligentes e tempestivas” para tornar o conteúdo indisponível assim que teve conhecimento de sua ilicitude.

Origem e repercussão dos casos analisados

A nova tese foi formulada a partir do julgamento de dois recursos extraordinários: um movido pelo Facebook (RE 1037396), sob relatoria do ministro Dias Toffoli, e outro pelo Google Brasil (RE 1057258), relatado pelo ministro Luiz Fux. No primeiro caso, os ministros negaram o provimento ao recurso da Meta (controladora do Facebook), mantendo decisão contrária à empresa. Já no segundo, foi dado provimento ao recurso do Google, afastando sua condenação imposta pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

Embora os casos fossem distintos, o julgamento foi reunido em torno de uma mesma temática, considerada de repercussão geral, ou seja, com potencial para influenciar centenas de processos semelhantes no país. A nova jurisprudência do STF deverá orientar juízes e tribunais inferiores na análise de casos que envolvam a responsabilização civil de empresas de tecnologia por danos causados a terceiros.

Apelo ao Congresso Nacional e o futuro da regulação digital

A decisão do Supremo também vem acompanhada de uma cobrança direta ao Congresso Nacional. Os ministros destacaram que a omissão legislativa nesse campo compromete a efetiva proteção dos direitos fundamentais em meio digital e apelaram para que o Parlamento aprove, com urgência, uma legislação moderna e específica sobre responsabilidade de plataformas na internet.

A discussão envolve temas sensíveis e ainda controversos, como os limites da liberdade de expressão, o combate às fake news, a segurança da informação e o papel dos algoritmos na difusão de conteúdos ilícitos. Sem uma regulação clara, o vácuo legal pode gerar insegurança jurídica, tanto para usuários quanto para as próprias empresas, segundo alertam especialistas em direito digital.

A nova diretriz do STF não representa o fim da discussão, mas inaugura uma nova etapa no debate sobre a responsabilidade das big techs, que terão agora o dever de adotar políticas mais robustas de moderação, prevenção e resposta a conteúdos que possam causar danos à coletividade.

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