O mercado de carne bovina no Brasil vive um momento de transição delicada e com possíveis repercussões diretas sobre o bolso do consumidor nos próximos meses. De acordo com dados apurados no primeiro trimestre de 2025, o país registrou um patamar inédito de abate de fêmeas, que representaram mais de 47% do total de bovinos abatidos no período. Esse movimento, embora previsto dentro dos ciclos naturais da pecuária, sinaliza uma virada importante no ritmo da oferta e poderá impactar os preços tanto na porteira quanto nas gôndolas dos supermercados e balcões de açougues.
Historicamente, o aumento no número de vacas enviadas ao abate costuma indicar o fim de um ciclo de baixa nos preços da arroba do boi gordo. Com menos fêmeas nos pastos, a produção de bezerros tende a cair, o que, por consequência, reduz o volume de animais disponíveis para abate no médio e longo prazo. Segundo o analista de commodities da Datagro, João Figueiredo, o Brasil alcançou um nível inédito de descarte de fêmeas, algo comum apenas em países com rebanhos mais estáveis como Austrália e Estados Unidos.
“Poderemos manter esse nível de 47% sem comprometer imediatamente o tamanho do rebanho, mas já vemos indícios de que, sazonalmente, essa curva deve recuar no segundo semestre”, avaliou Figueiredo. A projeção da consultoria é de que a proporção de vacas no total de abates caia para 39,2% até o final de 2025, com uma queda mais acentuada prevista a partir de 2026, à medida que os pecuaristas passam a reter mais fêmeas para recompor o plantel e estimular a produção de bezerros.
A consequência mais imediata dessa virada é a redução da oferta de carne no mercado interno, o que pressiona o preço do boi gordo para cima. A cotação da arroba, conforme levantamento do Cepea, acumula alta de mais de 37% na comparação com o mesmo período do ano passado. Essa valorização, contudo, não atinge apenas os grandes frigoríficos ou exportadores. A maior parte da carne consumida no Brasil, cerca de 60% segundo os especialistas, é comercializada em açougues de bairro, que trabalham majoritariamente com carne de fêmeas, geralmente mais acessível e com cortes populares.
Para o diretor-fundador da Scot Consultoria, Alcides Torres, ainda que a concorrência da carne bovina com outras proteínas animais possa limitar a escalada dos preços no campo, a dinâmica do varejo tende a ser mais complexa. “O preço no supermercado tem lógica própria. Se o gerente percebe que um determinado corte está vendendo bem, ele não reduz o valor mesmo que a cotação da arroba caia”, pontuou.
Leonardo Alencar, diretor de agronegócios da XP Investimentos, acrescenta que o recorde no abate de vacas no início do ano foi impulsionado principalmente por frigoríficos de menor porte, voltados para o abastecimento interno. Esses frigoríficos encontraram na oferta elevada de fêmeas uma forma de contornar a valorização do boi gordo, mas tal estratégia tem prazo de validade. “A partir de 2026, veremos uma escassez mais evidente de vacas no mercado, porque a retenção de fêmeas deve se intensificar, priorizando a reprodução e a recomposição do rebanho”, afirmou Alencar, durante a Feicorte, em Presidente Prudente.
Essa virada de ciclo também deverá afetar a indústria. Com menos animais disponíveis para abate, os frigoríficos poderão enfrentar um aperto de margens. “Num cenário de menor oferta, a indústria não consegue repassar todo o aumento de custos para o consumidor. Isso espreme os frigoríficos como intermediários da cadeia”, concluiu Alencar.
O panorama desenhado aponta para um segundo semestre de 2025 desafiador para todos os elos da cadeia da carne. Do produtor rural ao consumidor final, passando pelos distribuidores e comerciantes, a necessidade de adaptação a um novo ciclo pecuário exigirá cautela, planejamento e vigilância constante sobre os preços e as dinâmicas do mercado.
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