“Muita coisa, quase nada”: o verso de “Ela e eu”, canção de Caetano Veloso, está tatuado no braço de Samantha Jones, simbolizando sua jornada de transformação sem jamais esquecer suas origens. Oito anos antes de interpretar a Zinha de “Renascer”, atual novela das nove da Globo, a atriz deixou o interior da Bahia, onde morava com seus pais, Tarciana e Cesar, para encontrar o seu destino.
Nascida em Salvador e criada em Senhor do Bonfim, no sertão baiano, a jovem teve seu primeiro contato com a arte cedo. A música e o circo foram os primeiros a chegarem na vida de Samantha, ainda na infância.
Os pais da atriz, casados até hoje, sempre a incentivaram e deram corda para a filha voar. Tanto que a jovem chegou a fazer intercâmbio na Inglaterra quando tinha 15 anos. Mas foi aos 18, quando desembarcou no Rio, que ela entrou para a faculdade de Atuação Cênica numa universidade pública e fez muitas descobertas no início de sua fase adulta.
— Fiquei uma semana na casa de uma pessoa, depois fui viver em uma república, dividi apartamentos um tempão com grandes amigos… Só depois de alguns trabalhos, consegui me estabilizar um pouquinho, porque estabilidade total mesmo é difícil. Trabalhei em muita coisa. Dei aula de violão, tocava em barzinho, fiz algumas peças mal pagas e trabalhei numa loja de eletrônicos do pai de uma amiga também. Tive ajuda dos meus pais, muito importante conta a artista, que chegou a morar sozinha durante dois anos, e, atualmente, vive com a namorada, a também atriz Manu Morelli, e dois gatinhos, a Exalta e o Samba.
Samantha e Manu se conheceram por terem amigos em comum e se apaixonaram de cara. Em um ano e meio de relação e vivendo sob o mesmo teto, elas já pensam em oficializar a união.
— É uma relação muito gostosa. É muito prazeroso ter uma pessoa ao meu lado que, além de eu admirar como artista, me inspira por ser quem é. Acho o máximo oficializar a união. Gostaria de chamar os amigos e fazer o enlace simbolicamente. Ter filhos também é uma coisa que a gente quer que aconteça, independentemente da forma que for. Pode ser adoção ou se alguma de nós quiser engravidar… Estamos abertas a todas as possibilidades conta.
Se em “Renascer” Zinha vem descobrindo sua sexualidade agora, com cenas em que denota interesse pela professora Lu (Eli Ferreira), Samantha também passou por questionamentos sobre sua orientação na adolescência, e resolveu de forma natural, com uma ajudinha da terapia.

— Faço terapia há alguns anos, então alguns conflitos estão resolvidos, outros não. Em relação a minha sexualidade, tudo certo. Sou bissexual. Morar numa cidade pequena me gerava medo de não ser aceita. Meus pais me deram apoio, então foi mais fácil me desvincular dos meus medos e passar por isso de forma mais leve. A primeira vez que fiquei com mulher foi aos 17 anos. A descoberta foi uma coisa fluida.
Me questionava por que não tinha ficado com outras meninas antes, aí me lembrava das vezes em que me interessei por alguma diz Samantha, que, antes de namorar Manu, teve relacionamentos com homens e outras mulheres, sem preconceitos: Sabe aquela coisa que a pessoa fala: “Ah! Quem gosta de tudo fica mais satisfeito”? Eu acho o oposto. Me acho muito criteriosa justamente porque gênero não é um critério para mim.
Uma das características físicas mais marcantes de Zinha é o cabelo black. Desde o início da novela, a menina surgiu com os fios cacheados e volumosos, gerando muitos comentários nas redes sociais. Aparecer no horário nobre com as madeixas naturais é uma vitória para Samantha.
— O cabelo, de um modo geral, é uma coisa muito importante. Tenho recebido mensagens muito bacanas, meninas estão se identificando. É emocionante quando leio recados desse tipo. Eu alisei meu cabelo por muito tempo, a adolescência inteira. Foi libertador deixar meus fios do jeito que são. É pra ontem a naturalização de corpos e cabelos ocupando espaços na TV analisa.
Apesar do sucesso do black power com boa parte do público, a atriz sofre ataques por conta de sua aparência na telinha:
— Recebo muitos prints elogiosos de amigos, mas já li comentários cruéis de pessoas mandando eu cortar o cabelo. Teve um que era assim: “menina linda, só falta dar um jeito nessa juba”. Tento não ler essas mensagens nem respondê-las. Mas confesso que eu percebo que os elogios têm aparecido em maior quantidade.
Se hoje os “aplausos” no que diz respeito a sua aparência servem como combustível para a continuidade de seu trabalho, no passado, Samatha sofreu por conta de sua autoestima.
— Hoje ainda tenho momentos de altos e baixos. Durante a adolescência foi difícil para mim, eram momentos de autoestima baixa total. Foi um período em que eu não gostava da minha imagem, tinha milhões de questões por conta disso. Eu não sabia qual era minha identidade, quem eu era, o que vestia, o que fazia. A arte me salvou pontua.
Luta vegetariana
Atualmente uma das bandeiras da atriz é o vegetarianismo, que ela pratica desde os 16 anos. A mudança para o regime foi brusca, mas agora ela vem tentando ser vegana aos poucos, até parar totalmente de consumir alimentos que sejam derivados de animal. Samantha também não usa produto algum que tenha sido testado em bichos.
— Sempre pesquisei sobre o impacto da carne, não apenas para os animais, mas na indústria capitalista e também no que isso interfere no nosso corpo, na natureza e no nosso bolso. Sempre me interessei sobre o assunto. Me considero vegetariana, mas o veganismo está dentro de mim. Não consigo falar que sou vegana porque como batata frita do McDonald’s.
Mesmo que seja só batata, a origem dela é desse restaurante. Estou numa transição. Já passei muitos perrengues com isso. Minha avó, por exemplo, não tempera feijão achando que não consumo tempero. Convivo muito bem com pessoas que comem carne, como a Manu, por exemplo. Ela é gaúcha, adora churrasco. Eu cozinho muito comida vegana que ela adora, e, quando ela quer carne, a gente separa e fica na paz — explica.