Mato Grosso do Sul, 20 de junho de 2025
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A sombra do silêncio: o arsenal nuclear de Israel e os dilemas globais da não proliferação

Em meio à escalada no Oriente Médio, cresce o debate sobre a existência de armas atômicas em Israel, um país que nunca confirmou seu arsenal, mas tampouco o negou

A recente tensão entre Israel e Irã reacendeu uma das discussões mais delicadas da segurança global: o suposto arsenal nuclear israelense, envolto em décadas de segredo, negações formais e política ambígua. Enquanto o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu sustenta que a ofensiva contra Teerã visa impedir a construção de uma bomba atômica iraniana, cresce a pressão internacional sobre o próprio Israel, que jamais confirmou nem desmentiu oficialmente possuir armas nucleares, mas é amplamente reconhecido como uma das nove potências nucleares do planeta.

Segundo estimativas da Campanha Internacional para a Abolição de Armas Nucleares (ICAN) e da Federação de Cientistas Americanos (FAS), Israel teria hoje cerca de 90 ogivas nucleares operacionais e material físsil suficiente para dobrar esse número. Contudo, sua postura de ambiguidade estratégica o chamado “não confirmar nem negar” impede qualquer tipo de inspeção ou diálogo formal com os organismos internacionais que regulam a não proliferação.

O sigilo como estratégia e legado histórico

As raízes do programa nuclear israelense remontam às décadas de 1950 e 1960. Com apoio indireto da França e da complacência dos Estados Unidos, o Estado judeu construiu, em segredo, seu primeiro reator nuclear na instalação de Dimona, no deserto de Negev. Documentos desclassificados e testemunhos de ex-funcionários revelam que, já na virada dos anos 1970, Israel tinha capacidade de construir armas nucleares, o que se acredita ter acontecido antes da Guerra do Yom Kippur, em 1973.

Para muitos especialistas, como Avner Cohen, professor do Instituto Middlebury e referência no tema, a opção nuclear de Israel surgiu como uma “garantia existencial”, moldada pelo trauma do Holocausto e pelas sucessivas guerras com vizinhos árabes. Mais do que uma ferramenta militar, a bomba tornou-se um símbolo do “nunca mais” — uma espécie de escudo psicológico e estratégico.

Essa política se sustentou ao longo das décadas por meio da dissimulação e da recusa em assinar o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), documento-chave do regime internacional de controle de armas atômicas. Ao evitar esse compromisso, Israel ficou fora das obrigações de transparência, desarmamento gradual e fiscalização da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), às quais estão submetidos os países signatários.

As contradições da diplomacia nuclear

A postura de Israel representa um paradoxo incontornável. De um lado, o país age de forma sistemática para evitar que outras nações da região obtenham capacidade nuclear caso notório do bombardeio de reatores no Iraque, na Síria e as ameaças recorrentes ao Irã. De outro, mantém seu próprio arsenal sem supervisão externa, amparado no silêncio de seus aliados, especialmente os Estados Unidos.

Washington, apesar de ser o principal defensor do TNP e de pressionar países como Irã e Coreia do Norte por maior transparência, adota uma política leniente com Israel, justificando sua tolerância pela estabilidade regional e pela aliança estratégica no Oriente Médio. Essa duplicidade tem gerado críticas severas de organizações internacionais, que apontam para o risco de enfraquecimento das normas globais e para o estímulo a programas secretos em países como Arábia Saudita, Egito e Turquia.

Segundo o professor Nicholas Miller, da Universidade Dartmouth, “a posse de armas nucleares por Israel, aceita tacitamente por Washington, mina os esforços globais de não proliferação e legitima, para alguns, a busca por dissuasão semelhante”. A ausência de Israel no TNP, junto com Índia, Paquistão e Coreia do Norte, é vista como um dos principais obstáculos à criação de uma zona livre de armas nucleares no Oriente Médio — proposta defendida por diversas nações árabes na ONU há décadas.

Armas ocultas, riscos evidentes

Embora o número estimado de armas nucleares em posse de Israel seja pequeno em relação aos arsenais da Rússia ou dos Estados Unidos, seu impacto geopolítico é desproporcional. A simples suspeita de que o país detém ogivas prontas para uso, lançáveis por mísseis, aviões ou submarinos, alimenta tensões permanentes e incertezas militares.

Em 2023, declarações do ministro do Patrimônio, Amichai Eliyahu, sugerindo um possível uso de bomba nuclear contra Gaza, causaram alarme internacional. Mesmo tratada como retórica extremista, a fala expôs o desconforto com a opacidade do programa e com o silêncio institucional que o cerca.

A ICAN, vencedora do Prêmio Nobel da Paz em 2017, classifica a situação como um risco grave à estabilidade regional. Em relatório recente, a organização alerta que “a aceitação pública tácita das armas nucleares de Israel, combinada à sua política de dissimulação, encoraja a proliferação e enfraquece os mecanismos de controle internacional”.

O futuro da dissuasão em um mundo multipolar

A Guerra Fria legou ao mundo um acúmulo de 70 mil ogivas nucleares no auge do conflito. Desde então, esforços bilaterais entre Estados Unidos e Rússia conseguiram reduzir esse número para cerca de 12 mil. No entanto, a perspectiva de desarmamento encontra novos desafios no século XXI: disputas tecnológicas, nacionalismos agressivos, tensões regionais e a crescente desconfiança nos organismos multilaterais.

Israel, nesse contexto, representa uma incógnita estratégica. Sua política de ambiguidade foi eficaz em garantir segurança durante décadas, mas hoje encontra um mundo mais conectado, mais vigiado e mais crítico da opacidade estatal. A manutenção de seu arsenal fora do TNP pressiona adversários, desestabiliza o regime de não proliferação e estimula o surgimento de novas potências nucleares informais.

No fim das contas, a bomba invisível de Israel é uma sombra real que paira sobre a segurança global. Enquanto ela não for reconhecida, regulada ou desmantelada, o risco de proliferação nuclear continuará a ser alimentado não apenas pelos que desejam a bomba, mas também por aqueles que, em silêncio, já a detêm.

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