O presidente afastado do Corinthians, Augusto Melo, vive um dos momentos mais turbulentos de sua trajetória à frente do clube. Nesta segunda-feira, Melo anunciou oficialmente o fim da atuação do advogado Ricardo Cury na sua defesa. A saída ocorre em meio ao processo de impeachment e ao indiciamento do dirigente no caso Vai de Bet, envolvendo acusações de lavagem de dinheiro, associação criminosa e furto qualificado por abuso de confiança.
Com a mudança, José Eduardo Cardozo, ex-ministro da Justiça durante o governo de Dilma Rousseff e experiente advogado em causas políticas, passa a liderar a defesa jurídica de Melo. A troca ocorre num momento decisivo, em que o dirigente busca reverter a decisão do Conselho Deliberativo, que aprovou a sua destituição no último dia 26 de maio, por ampla maioria de 176 votos a 57.
A relação entre Ricardo Cury e Augusto Melo vinha desde a campanha eleitoral de 2023, quando o então candidato derrotou André Negão, representante do tradicional grupo político Renovação e Transparência. Durante meses, Cury esteve ao lado de Melo em diversos episódios marcantes, incluindo duas coletivas de imprensa em maio, uma delas ocorrida logo após o indiciamento do presidente afastado.
Em nota oficial, o escritório Cury e Augusto Neves anunciou a renúncia ao caso, destacando profundas discordâncias com a nova estratégia adotada pelo cliente. Segundo o comunicado, “a estratégia de defesa foi reorientada nos últimos dias por outros colegas e ações foram decididas e executadas sem que o nosso escritório tivesse ciência prévia ou qualquer concordância”. A nota ainda ressalta que toda a atuação anterior foi pautada pela “serenidade, temperança, respeito aos órgãos e à institucionalidade do Corinthians, além da sustentação de argumentos jurídicos sólidos”.
O comunicado encerra afirmando: “Seguro da consistência das teses de defesa e estratégias construídas ao longo de vários meses de trabalho, mas desautorizado na mudança abrupta de rumo e alijado do processo de decisão, o escritório renuncia a todos os poderes que lhe foram outorgados e deseja toda a sorte a Augusto Melo no retorno à função presidencial para a qual foi eleito democraticamente”.
José Eduardo Cardozo, que já atuava em algumas questões específicas, agora lidera a defesa de Melo. Aliado de Marcos Ragazzi e José Trucilio Junior, ambos próximos do dirigente, Cardozo tentou suspender judicialmente a votação do impeachment, mas não obteve sucesso. A Justiça de São Paulo indeferiu o pedido, permitindo que o Conselho Deliberativo prosseguisse com a destituição de Melo, aprovada no fim de maio.
Com vasta experiência no cenário político e jurídico, José Eduardo Cardozo foi advogado-geral da União, deputado federal e procurador do Ministério Público de São Paulo. Além disso, desempenhou papel central na defesa da ex-presidente Dilma Rousseff durante o processo de impeachment em 2016, o que lhe conferiu notoriedade nacional.
A troca de advogados ocorre num momento de intensa movimentação política no Parque São Jorge, sede social do clube. Embora afastado e com o impeachment aprovado pelo Conselho Deliberativo, Augusto Melo ainda busca retomar a presidência. Para isso, tenta impedir que a decisão seja referendada na Assembleia de Sócios, marcada para o dia 9 de agosto, último obstáculo formal para a sua destituição definitiva.
Melo e seus aliados contestam a legalidade do processo que culminou no impeachment. O presidente afastado sustenta que o presidente do Conselho Deliberativo, Romeu Tuma Júnior, está suspenso desde 9 de abril, e, por essa razão, todas as ações conduzidas por ele, incluindo o trâmite do processo de destituição, seriam nulas. Tal afastamento resultou de dois processos disciplinares movidos pelo conselheiro Roberto William Miguel, mais conhecido como Libanês.
Em meio à vacância gerada, Maria Angela de Sousa Ocampos, primeira secretária do Conselho, se autoproclamou presidente interina, justificando a sua decisão com base na ausência do vice-presidente Roberson de Medeiros, afastado por licença médica. Ocampos, considerada uma aliada próxima de Melo, reivindica a condução dos trabalhos legislativos do clube.
Romeu Tuma Júnior, por sua vez, contesta o afastamento. Segundo ele, não foi formalmente notificado da decisão e entende que o afastamento, votado apenas no Comitê de Ética, não possui validade plena, pois não foi apreciado pelo plenário do Conselho Deliberativo.
No último sábado, o impasse culminou em uma confusão nas dependências do clube. Augusto Melo esteve pessoalmente no Parque São Jorge, gerando grande tumulto entre conselheiros, aliados e opositores, reflexo da polarização que marca atualmente o ambiente político corintiano.
No domingo, por meio de sua assessoria, Melo informou que sua defesa prepara novas medidas judiciais para anular a votação do impeachment e garantir a sua recondução imediata à presidência. Em carta enviada aos conselheiros, o presidente afastado reforçou a sua disposição em lutar até as últimas instâncias, tanto dentro quanto fora do clube.
“Afirmo que, se necessário for, lutarei com todas as minhas forças, até as últimas instâncias deliberativas do nosso clube ou da Justiça brasileira, para manter o mandato para o qual fui democraticamente eleito e do qual algumas pessoas, por interesses feridos ou inconfessáveis, com evidente truculência, pretendem me afastar de modo ilegal”, escreveu Melo, demonstrando disposição para seguir na disputa.
A Assembleia Geral de Sócios, prevista para agosto, será o desfecho de uma das mais conturbadas crises políticas da história recente do Corinthians. Enquanto isso, o clube e sua torcida assistem atônitos aos desdobramentos que transcendem o campo esportivo e expõem as complexas relações de poder no interior da maior instituição esportiva de São Paulo.
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