A alta no preço dos alimentos tem sido uma das principais responsáveis pelo aumento da inflação no Brasil nos últimos anos. Em 2024, o cenário não foi diferente. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os preços dos alimentos subiram 7,69% ao longo do ano, contribuindo significativamente para que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) atingisse 4,83%.
Esse fenômeno tem se tornado recorrente. Desde 2018, a inflação dos alimentos superou a inflação geral em sete dos últimos dez anos. Entretanto, essa realidade nem sempre foi a mesma. Até 2004, era raro a comida subir mais do que os preços em geral, mas a partir de 2005 esse cenário começou a mudar.
Especialistas apontam que essa alta persistente dos preços não é um problema pontual, causado por eventos climáticos ou oscilações no consumo interno. O principal fator, segundo economistas, está na priorização da exportação de commodities agrícolas, reduzindo a oferta de alimentos para os brasileiros e pressionando os preços dentro do país.
O crescimento das exportações e o impacto no consumo interno
Nos últimos 30 anos, o Brasil se consolidou como um dos maiores exportadores de soja do mundo. O grão ocupa atualmente 44,6 milhões de hectares do território nacional, contra os 10,6 milhões registrados em 1993. No entanto, cerca de 65% da soja produzida no país não é destinada ao consumo interno, e sim ao mercado internacional.
Por outro lado, alimentos tradicionais na mesa do brasileiro, como o feijão, tiveram sua área de plantio reduzida nos últimos anos. Enquanto a soja cresce, a produção de feijão caiu de 3 milhões para 2,7 milhões de hectares na última década. Esse fenômeno explica, em parte, a alta nos preços do grão, que em 2022, por exemplo, subiu 27,77%.
Essa lógica se repete em outros setores. A carne, que registrou um aumento de 20,84% em 2024, também tem sido priorizada para exportação. O Brasil bateu recordes na venda de carne para o exterior nos últimos anos, reduzindo a oferta interna e tornando o produto mais caro para os consumidores brasileiros.
O peso das commodities na inflação brasileira
O economista José Giacomo Baccarin, professor da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) e diretor do Instituto Fome Zero (IFZ), explica que a inflação dos alimentos está diretamente ligada ao modelo agrícola adotado pelo Brasil nas últimas décadas.
“Há um claro movimento de direcionamento da produção para a exportação. Quando os preços das commodities sobem no mercado internacional, os produtores naturalmente priorizam as vendas para fora. Isso reduz a oferta interna e encarece a alimentação da população brasileira”, afirma Baccarin.
Outro especialista, Walter Belik, professor aposentado da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e um dos fundadores do IFZ, aponta que a alta nos preços dos alimentos é um fenômeno global, mas que afeta mais intensamente países que dependem da exportação. “O mundo tem enfrentado um novo patamar de preços dos alimentos desde o início dos anos 2000. Guerras, crises climáticas e instabilidades financeiras têm contribuído para aumentos expressivos. O Brasil, por sua vez, sofre mais porque não estabelece medidas de controle sobre a produção e exportação”, explica.
Soluções para o problema
Diante desse cenário, especialistas sugerem que o Brasil adote políticas públicas para equilibrar a exportação com a necessidade de abastecimento do mercado interno. Baccarin defende que o governo federal crie mecanismos para controlar o volume de exportações de produtos essenciais para a alimentação da população.
“Não se trata de proibir as exportações, mas sim de garantir que o abastecimento interno não seja prejudicado. Hoje, essa decisão está nas mãos do setor privado, que prioriza o lucro e não a segurança alimentar dos brasileiros”, ressalta o economista.
O governo federal já anunciou medidas para tentar reduzir o impacto da inflação dos alimentos, como a facilitação da importação de produtos quando os preços estiverem elevados no mercado interno. No entanto, especialistas alertam que isso pode não ser suficiente para conter o problema de forma estrutural.
Uma das promessas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi a recomposição dos estoques públicos de alimentos, permitindo que o governo intervenha diretamente no mercado em momentos de alta. A iniciativa ainda não saiu do papel, mas é vista como uma das possíveis soluções para evitar que a população seja prejudicada pela priorização das exportações.
O desafio de equilibrar produção e consumo
A inflação dos alimentos é um problema complexo, que envolve fatores internos e externos. O Brasil, como grande produtor agrícola, precisa encontrar um equilíbrio entre sua vocação para exportação e a necessidade de garantir preços acessíveis para a sua população.
Enquanto medidas concretas não são implementadas, os consumidores seguem sentindo no bolso os impactos dessa dinâmica, tornando a alimentação uma preocupação cada vez maior para as famílias brasileiras.
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