A tragédia ocorrida na noite da última quarta-feira, 21 de maio, na BR-163, nas proximidades de São Gabriel do Oeste, Mato Grosso do Sul, trouxe novamente à tona a face cruel da rodovia, que, há anos, é conhecida pela população local como a “rodovia da morte”. A vítima da vez foi Alberto Barbosa dos Santos, de 72 anos, que perdeu a vida ao colidir violentamente com a estrutura de concreto de uma ponte inacabada, símbolo do abandono e do descaso que pairam sobre a principal estrada que corta o Estado.
O motorista, natural de Campo Grande, seguia com destino a Rondonópolis, no Mato Grosso, conduzindo um caminhão carregado de pneus quando, ao trafegar pelo trecho situado entre um frigorífico e o posto da Polícia Rodoviária Federal, perdeu o controle do veículo. O caminhão saiu da pista, adentrou a vegetação e colidiu contra a estrutura de uma ponte ainda em construção. O impacto foi tão violento que Alberto morreu no local, preso às ferragens. A CCR MSVia, concessionária responsável pela administração da BR-163, foi acionada para realizar os trabalhos de resgate e a remoção do corpo, enquanto a ocorrência foi formalmente registrada na Delegacia de Polícia Civil de São Gabriel do Oeste.
Apesar da gravidade do acidente, o tráfego na rodovia não foi interrompido, prosseguindo normalmente nos dois sentidos. Contudo, o fluxo contínuo de veículos esconde uma realidade preocupante: a precariedade da infraestrutura, o estado inacabado de várias obras e a ausência de duplicações em trechos críticos que, ao longo dos anos, se converteram em palco de tragédias como a que vitimou Alberto.
A promessa não cumprida e a paralisação da duplicação da BR-163
A BR-163 é um dos principais eixos rodoviários do país, cortando o Mato Grosso do Sul de Norte a Sul, desempenhando papel essencial para o escoamento da produção agrícola e para o trânsito de milhares de pessoas diariamente. Quando, em 2014, a CCR MSVia assumiu a concessão da estrada, o contrato previa, entre outras obrigações, a duplicação de mais de 800 quilômetros da rodovia, com prazo para conclusão em cinco anos. A promessa alimentou a esperança de segurança, desenvolvimento e modernização da infraestrutura de transporte para o Estado.
Entretanto, passados mais de dez anos desde o início da concessão, apenas cerca de 150 quilômetros foram efetivamente duplicados. As demais obras, incluindo dezenas de pontes, viadutos e passarelas, ficaram pelo caminho, paralisadas ou sequer iniciadas. A ponte onde Alberto perdeu a vida é um desses monumentos ao abandono, que exemplifica a negligência que hoje compromete não apenas a segurança dos motoristas, mas também o desenvolvimento econômico e social da região.
O argumento oficial da concessionária para a paralisação das obras é a alegada falta de viabilidade econômica do projeto diante da queda no volume de tráfego e da arrecadação. Contudo, especialistas apontam que a empresa priorizou a instalação de praças de pedágio ao longo de toda a extensão da rodovia, aumentando os custos para os usuários sem garantir a contrapartida de segurança e infraestrutura prometida.
Rodovia da morte: números que assustam
Com uma estrutura precária, pistas simples em grande parte da sua extensão e manutenção aquém do necessário, a BR-163 acumula um histórico trágico. De acordo com dados da Polícia Rodoviária Federal, somente em 2024 foram registrados mais de 1.500 acidentes no trecho sul-mato-grossense, resultando em pelo menos 220 mortes e centenas de feridos, muitos deles com sequelas permanentes.
Entre os fatores que contribuem para esse elevado índice de sinistros estão a ausência de acostamentos adequados, a sinalização deficiente, o excesso de curvas perigosas e a má conservação do pavimento. A não conclusão da duplicação agrava ainda mais o risco de colisões frontais, especialmente em trechos de pista simples que não comportam o intenso fluxo de caminhões e veículos leves que por ali trafegam diariamente.
A situação é ainda mais alarmante quando se observa que, em muitos pontos da rodovia, obras iniciadas pela CCR MSVia foram simplesmente abandonadas, criando cenários de risco iminente, como estruturas inacabadas e trechos com desvios perigosos, como aquele que ceifou a vida de Alberto Barbosa dos Santos.

Indignação e cobrança de providências
Diante deste cenário, cresce a indignação da sociedade civil, de autoridades políticas e de entidades ligadas ao transporte e à defesa dos direitos dos usuários. A Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Mato Grosso do Sul (OAB-MS), já solicitou diversas vezes a revisão do contrato de concessão e a aplicação de sanções à CCR MSVia pelo descumprimento das cláusulas contratuais.
Parlamentares estaduais e federais também pressionam a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para que adote medidas mais rigorosas contra a concessionária. Há quem defenda a cassação da concessão e o retorno da administração da rodovia à esfera pública, ao menos até que se encontre um modelo viável que assegure a duplicação e a manutenção adequada da estrada.
O Ministério Público Federal em Mato Grosso do Sul (MPF-MS) abriu inquérito para investigar a atuação da CCR MSVia e verificar as responsabilidades legais pelo não cumprimento do contrato, além de apurar os danos causados aos usuários e ao erário.
O luto de uma família e o clamor por justiça
Enquanto autoridades e entidades debatem soluções, familiares e amigos de Alberto Barbosa dos Santos choram a sua perda precoce, que se soma a milhares de outras vítimas dessa rodovia marcada pela negligência e pelo abandono. O caminhoneiro, que há mais de 40 anos percorria as estradas brasileiras, conhecia bem os riscos da BR-163, mas, como muitos outros profissionais, não tinha alternativa senão enfrentá-los diariamente.
Sua morte reacende o debate sobre a urgência da retomada das obras de duplicação, da melhoria da sinalização e da implementação de políticas públicas efetivas para reduzir o número de acidentes e preservar vidas.
A BR-163, que deveria ser um corredor de desenvolvimento e integração regional, permanece, lamentavelmente, como uma das rodovias mais perigosas do Brasil, sinônimo de tragédia, dor e frustração para os sul-mato-grossenses.
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