A Polícia Civil investiga uma denúncia de importunação sexual ocorrida durante um show de stand-up comedy em São Paulo, contra uma comediante cega.
Um vídeo que circula nas redes sociais mostra o momento em que os comediantes Tatá Mendonça e Cadu Moura estão no palco. Enquanto fala ao microfone, o acusado coloca a mão nas costas da então colega e desce para a região das nádegas. Segundos depois, ela retira a mão dele.
O site não conseguiu contato com Cadu, que, aparentemente, desativou as redes sociais. Além de comediante, o acusado trabalhava para Tatá como editor.
Em nota, a Secretaria da Segurança Pública informou que o caso foi registrado como importunação sexual na Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência e encaminhado ao 92º Distrito Policial (Parque Santo Antônio), responsável pela área dos fatos, que instaurou um inquérito policial e trabalha para esclarecer os fatos.
Na noite desta quinta-feira (19), Tatá – que é deficiente visual – comentou o caso em seu Instagram (@ceganacomedia), onde tem 667 mil seguidores.
“Não sei nem por onde começar. Pra variar, assédio… Sofri um assédio no palco. Ele era meu editor, supostamente. O dinheiro que eu pagava pra você, eu tirava, muita vezes, da minha boca, porque eu sabia onde eu tinha potencial para chegar”, desabafou ela.
“Na hora, realmente fiquei chocada. É surreal, eu não estou acostumada, de nenhuma forma, ser exposta desse jeito. Eu não tenho estômago para falar, fico muito feliz que tenha o vídeo. Surtei porque achei que não ia ter vídeo, aí é difícil, porque eu não ia querer me expor. É difícil, mas, meninas, vamos começar a expor. Eles são nojentos, eles têm que passar vergonha”, completou.
“Nunca tinha acontecido comigo desse jeito, de encostar em mim tão explícito. Nem sei, viu. Foi surreal, porque eu estava trabalhando, não estava brincando. Não tenho condições de ficar me pronunciando, é difícil.”
Sem citar o nome de Cadu, a comediante falou sobre a relação que tinha com ele e sobre como o ex-funcionário era tratado pelos colegas de comédia.
“Estávamos todos lá para trabalhar e fazer comédia. Eu acho engraçado que essa pessoa, supostamente, tem muito apoio na cena. Eu, não. Eu sou cega, não tinha R$ 1 quando comecei. Tenho filho pra sustentar. Você, não. Você foi abraçado pela cena. Enxergando… E você é um bosta que conseguiu fazer isso”, disse.
“Você falava que participava de grupo de roteiro… Eu não tenho um grupo de roteiro. É tudo aqui [indicando a cabeça], tudo aqui [indicando o coração]. É talento, é esforço, trabalho, comprometimento, seriedade. É isso que eu sou, sou artista”, ressaltou Tatá.
“Não tem problema, não. Hoje, não posso postar você, porque tenho culhão para isso, mas, quando você perder, eu vou te postar, tá bom?”, finalizou.
Ela também falou sobre o preconceito sofrido em razão da deficiência visual e afirmou aos fãs e à família que não vai desistir da carreira após o episódio.
“Vim falar pro meu público agora: obrigada, viu, porque foram vocês que me subiram. Nunca vou esquecer de nada, de como cheguei até aqui. Deus é maravilhoso. Eu não vou deixar de trabalhar, não vou deixar de levantar minha cabeça, porque é isso: vou sair da pobreza mesmo que o branco não queira.”
“Vocês, como sociedade preconceituosa, sempre entregam, é incrível. Mas eu não sei ficar falando bonitinho, não. Meu estudo foi muito prejudicado por conta da sociedade que enxerga. Minha vida é difícil hoje por conta das pessoas que enxergam, porque é isso, é só você enxergar que você virou superior a todo mundo e eu sou só uma pessoa irracional”, refletiu Tatá.
Participação em programa da TV Globo
Na próxima segunda-feira, Tatá Mendonça participa do programa especial Falas de Acesso, da TV Globo, que tem como objetivo transformar o olhar da sociedade, especialmente na semana que marca o Dia de Luta da Pessoa com Deficiência (21 de setembro).
Ao longo do programa, o público assistirá a experimentos sociais que envolvem questões de preconceito, capacitismo, invisibilidade/experiência de não pertencimento e acessibilidade/exclusão.
Um dos experimentos criados para o especial é representado por Tatá.
Em um dos momentos do programa, ela pede que participantes leiam mensagens recebidas no perfil pessoal de sua rede social. Para justificar a solicitação, ela diz que o aplicativo do celular, responsável por transmitir as mensagens, está com problema e por isso não consegue saber o conteúdo.
Diante de palavras agressivas e críticas gratuitas, os participantes vão ler, omitir o conteúdo, e oferecer palavras de afeto e incentivo a ela. Para Tatá, a participação do público no experimento surpreendeu de forma positiva.
“O momento que mais me marcou foi quando os entrevistados descobriram que estavam participando de um teste e, mesmo assim, continuaram contribuindo conosco. Para mim, isso foi incrível. A transformação começou exatamente ali! Essa participação foi um divisor de águas na minha vida pessoal e profissional. Eu já conhecia e acompanhava o ‘Falas Femininas’ no Fantástico, mas devo admitir que foi uma surpresa muito positiva saber que haveria o ‘Falas de Acesso’ e que, além de acompanhar, eu estaria em um marco histórico”, disse ela.
“A cada momento, pude me surpreender com versões de mim que eu desconhecia e ser muito acolhida por pessoas que eu já admirava por acompanhar pela telinha do celular, dividir uma tela maior com pessoas que colaboraram e continuam colaborando com a luta da nossa comunidade foi, e será sempre, uma honra toda vez que eu assistir”, completou.