O que deveria alimentar o futuro das cidades de Água Clara e Rochedo acabou alimentando um esquema de corrupção. Investigação conduzida pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado) revelou um dos mais graves escândalos recentes envolvendo verbas públicas e merenda escolar em Mato Grosso do Sul. A operação, batizada de Malebolge, expôs um sistema de propina, fraudes em licitações e fornecimento de alimentos estragados para as escolas municipais.
No centro da trama está a empresa Zellitec Comércio de Produtos Alimentícios, que se apresentava como fornecedora de gêneros alimentícios para a merenda escolar, mas que, na prática, lucrava com contratos superfaturados, entregas parciais ou até mesmo inexistentes, e produtos em estado inaceitável de conservação. A investigação já apontou um desvio de mais de R$ 10 milhões.
O dono da empresa, Mauro Mayer da Silva, de apenas 27 anos, é apontado como o cabeça do esquema criminoso. Ele usava a Zellitec como fachada para garantir contratos de grande valor com as prefeituras de Água Clara e Rochedo, mesmo sem estrutura real para atender as demandas. Os contratos eram conquistados por meio de subornos a servidores públicos estratégicos, principalmente nas secretarias de Educação e Finanças.
Segundo relatório do Gaeco, a situação dentro das escolas era alarmante. Os alimentos entregues incluíam frutas e legumes apodrecidos, queijos e peixes sem rotulagem, sucos vencidos e carnes mal acondicionadas. Havia até relatos de baratas dentro de freezers inutilizados. Fotos feitas por servidores e anexadas ao inquérito mostram a gravidade do problema.
Em novembro de 2024, por exemplo, o servidor David Cláudio Neres registrou imagens chocantes durante a entrega da Zellitec: mamões, tomates e maçãs podres destinados à merenda de crianças. As imagens foram enviadas à servidora Ana Clara Benette, que, segundo o Gaeco, fazia parte do esquema e acobertava as irregularidades.
A fraude não parava nas entregas. Muitas vezes, os alimentos simplesmente não chegavam às escolas, e mesmo assim os pagamentos eram realizados integralmente, com a anuência de agentes públicos comprometidos com o esquema. A apuração revelou que notas frias eram emitidas e usadas para justificar os gastos, em conluio com empresários e funcionários municipais.
Foram denunciadas 11 pessoas, incluindo empresários e servidores:
- Mauro Mayer da Silva, 27 anos – Empresário, dono da Zellitec e apontado como líder do esquema
- Adriana Rosimeire Pastori Fini, 54 anos – Secretária de Educação de Água Clara
- Denise Rodriges Medis, 33 anos – Secretária de Finanças de Água Clara
- Ana Clara Benette, 36 anos – Servidora da Secretaria de Educação
- Jânia Alfaro Socorro, 51 anos – Servidora pública
- Kamilla Zaine dos Reis Santos Oliveira, 30 anos – Servidora pública
- Ícaro Luiz Almeida Nascimento – Empresário
- Leonardo Antônio Siqueira Machado, 29 anos – Empresário
- Adão Celestino Fernandes, 64 anos – Administrador de empresa
- Valmir Deuzébio, 56 anos – Comerciário
- David Cláudio Neres – Servidor que, apesar de ter flagrado as irregularidades, está sendo investigado por suposta participação no acobertamento das fraudes
O relatório afirma que a Zellitec não teria estrutura mínima para atender aos contratos firmados, mas que continuava vencendo licitações por meio de influência e pagamentos de propina. As licitações eram direcionadas, e os concorrentes eram desclassificados por critérios técnicos forjados, segundo a denúncia.
Além da fraude em licitação, o grupo é acusado de corrupção ativa e passiva, organização criminosa, falsidade ideológica e crime contra a saúde pública. A promotoria aponta que o grupo agia com frieza e desrespeito à população, colocando em risco direto a saúde de crianças em fase escolar.
A denúncia do Gaeco também cita que os alimentos vencidos ou impróprios para consumo não eram sequer separados corretamente nos depósitos, misturando-se aos que estavam dentro do prazo, o que tornava impossível garantir a segurança alimentar dos estudantes.
Apesar da gravidade do caso, nenhum dos denunciados apresentou defesa pública até o momento. A reportagem tentou contato com os envolvidos, mas não obteve retorno. O espaço segue aberto para manifestação das partes citadas.
Enquanto isso, as famílias das crianças afetadas e a população dos municípios exigem respostas. O caso abalou a confiança nas gestões municipais e trouxe à tona a necessidade de maior fiscalização na aplicação dos recursos públicos destinados à alimentação escolar.
O escândalo, que envolve vidas inocentes e um direito básico como a merenda, agora aguarda julgamento na Justiça. A expectativa é que os responsáveis sejam punidos com o rigor necessário para que casos como este não se repitam.
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