Um emaranhado de nomes, empresas e transferências suspeitas está no centro de uma investigação que escancarou um esquema bilionário de fraude contra aposentados e indígenas no país. O que parecia apenas mais uma associação de classe, a Conafer (Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais), virou alvo da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União após movimentar quase R$ 700 milhões de forma suspeita nos últimos anos.
No meio desse escândalo está Carlos Roberto Ferreira Lopes, pecuarista conhecido nos bastidores políticos e presidente da entidade, que ainda comanda uma loja de artesanato indígena dentro do aeroporto internacional de Brasília. Mas o que mais chama atenção é a teia de relações montada entre assessores, empresários e até um ex-ministro do governo Jair Bolsonaro.
Dinheiro saindo de aposentado e caindo no rastro de aliados
A Conafer, desde 2019, teria descontado valores diretamente dos benefícios de milhares de aposentados, muitos deles sem sequer saber que estavam associados à entidade. Os descontos mensais variavam entre R$ 45 e R$ 77 e aconteciam antes mesmo que o dinheiro chegasse nas contas dos beneficiários do Inss. Segundo a CGU, mais de R$ 688 milhões foram arrecadados dessa forma.
A bomba estourou de vez em abril de 2025, com a deflagração da operação Sem Desconto pela Polícia Federal. Documentos obtidos pela PF mostram que parte desse dinheiro foi parar em contas de pessoas ligadas a nomes conhecidos do alto escalão do antigo Inss.
Um dos nomes que chamou atenção foi Cícero Marcelino de Souza Santos, assessor direto de Carlos Lopes na Conafer. Ele foi flagrado em transações financeiras com José Laudenor, auxiliar administrativo que ganha cerca de R$ 1.500 mensais, mas aparece como sócio em empresas junto com José Carlos Oliveira — o ex-ministro do Trabalho e Previdência e também ex-presidente do Inss na gestão Bolsonaro.
Sócios de fachada ou laranjas? os nomes por trás da grana
José Laudenor divide sociedade com José Carlos Oliveira (que agora atende por Ahmed Mohamad Oliveira Andrade) em pelo menos duas empresas: Fayard Organizações e Serviços Empresariais e a Yamada e Hatheyer Serviços Administrativos LTDA. Nesta última também estavam a filha de Oliveira e Edson Akio Yamada, ex-diretor de Benefícios e Relacionamento com o Cidadão do Inss.
Para a Polícia Federal, esse arranjo pode ter sido criado justamente para movimentar grana de terceiros, esquentar dinheiro e simular legalidade em repasses suspeitos. O relatório da PF, com base em dados do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), aponta indícios claros de lavagem de dinheiro e burla do sistema financeiro.
A teia que liga os bastidores de Brasília a milhões em descontos
A investigação começou após reportagem do portal Metrópoles, em março de 2024, mostrar que 29 entidades credenciadas ao Inss tiveram um crescimento de até 300% no faturamento, mesmo estando envolvidas em mais de 60 mil processos por descontos indevidos nos benefícios de aposentados. Entre as mais citadas nas ações está justamente a Conafer.
A partir disso, o Inss, CGU e Polícia Federal abriram investigações que culminaram na operação nacional. Um dos primeiros impactos diretos foi a exoneração de André Fidelis, então diretor de Benefícios do Inss.
Apesar da gravidade do caso, José Carlos Oliveira, mesmo citado na investigação, não foi um dos alvos diretos da operação Sem Desconto até agora.
Conafer e Carlos Lopes tentam se distanciar da confusão
Em nota enviada à imprensa, a Conafer afirmou ter mais de 8 milhões de associados e presença em 4,5 mil municípios. A entidade tentou minimizar o escândalo dizendo que os valores vindos do Inss representam apenas 11% do total de sua receita. Sobre o presidente Carlos Lopes, alegam que suas atividades como pecuarista e empresário do artesanato indígena são separadas da atuação na Conafer.
Eles também garantiram acompanhar o desdobramento das investigações com “serenidade”, mas até agora não explicaram por que o assessor de Lopes fazia transações com o sócio do ex-presidente do Inss.
Um rastro que ainda está longe do fim
A Polícia Federal não descarta novas fases da operação e novas quebras de sigilo para seguir o rastro do dinheiro. A expectativa é de que mais nomes da alta cúpula do Inss sejam investigados.
Enquanto isso, milhares de aposentados continuam tentando recuperar o dinheiro perdido em descontos que nem sabiam que existiam.
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