Mais de 200 pessoas estão prestes a ficar sem moradia em Dourados e sem acesso a condições básicas de higiene, fato que pode aumentar ainda mais a crise sanitária vivida no município, que tem bandeira vermelha de risco de contágio da covid-19. Isso porque uma sentença do Juiz de Direito da 5ª Vara Cível da comarca de Dourados determinou que cerca de 40 famílias moradoras do bairro Guajuvira desocupem voluntariamente o local no prazo de 15 dias.
A sentença transitada em julgado, cujos efeitos passaram a se fazer presentes desde o início do mês de abril, é favorável à reintegração de posse requerida por duas pessoas que alegam ser proprietárias da área compreendida na quadra 42, encravada entre o antigo Clube Atlético Douradense (hoje residencial Guassú) e a região próxima ao Parque do Lago (hoje Ministério Público Federal).
O Ministério Público emitiu um parecer contrário ao requerimento de reintegração de posse. Para o MPE a ação é improcedente, considerando a ausência de demonstração cabal da posse por parte dos requerentes em relação a área ocupada, que por muito tempo ficou abandonada, com matagal e sem nenhuma benfeitoria ou utilização. Um barracão de reciclagens foi a única extensão de posse que as testemunhas ouvidas nos autos disseram ter ciência, porém fica do outro lado da avenida, ou seja, oposto ao lado ocupado pelas famílias.
De acordo com um dos advogados das famílias que estão correndo risco de ficarem sem moradia, Dr. José Roberto Teixeira “Com efeito, mesmo o contrato de compra e venda utilizado pelos autores como base do seu pedido de alegação de posse anterior, é precário, sem comprovação de que o cedente vendedor sequer detinha a posse que alegou; e isso nos anos de 1986”. Além de José Roberto também advogam na causa Cristina Mota, Fagner Medeiros e Rafael Medeiros.
“Após isso, não houve comprovação pelo cessionário adquirente dos hipotéticos direitos possessórios de qualquer exercício de posse que fosse, mesmo indireta”, explicou o Advogado. “Registros fotográficos comprovam que quando as famílias chegaram no local não havia nenhuma benfeitoria, apenas matagal”, acrescentou.
“Ressalta-se que se trata mesmo de contrato inventado ou “de gaveta”, já que não houve a comprovação pública sequer de suas assinaturas, com o reconhecimento de firma à mesma época ou o manejo da ação de usucapião”, afirmou o advogado.
Outro detalhe apurado pela reportagem é que não havia pagamento de IPTU desde 1996, sendo que após a instalação das famílias estas se organizaram e vem pagando os valores parceladamente. Com a sentença cumprida, mais de 200 pessoas ficarão sem alojamento em um cenário de pandemia mundial, com mais de 3.500 mortes diariamente, em todo o Brasil, neste mês de abril.
Em entrevista ao site, Luciane, uma das moradoras que está no local desde 2014, lamentou a decisão da Justiça e afirmou que não sabe para onde vai ir. “Estamos bastante apreensivos, achamos a sentença injusta, desde 2014 quando entramos aqui só tinha colonial, começamos a construir nossas casas do zero e agora teremos que desocupar os imóveis sem nenhuma indenização. Além de envolver lado material envolve emocional, toda uma vida está aqui. Para onde vai cada família?”, questionou a mulher.
Um outro morador chamado João Ademilson também falou do drama vivido pelas famílias. “A gente se sente da pior forma, você não tem paz, não tem tranquilidade. A família fica naquela agonia. Essa decisão demonstra que não estão nem ligando com a gente, todos que moram aqui é porque realmente precisam, gente que trabalha para sobreviver. Você coloca a cabeça no travesseiro para dormir e não sabe se no outro dia será expulso daqui”, lamentou.