Campo Grande, capital sul-mato-grossense, mergulha em mais um capítulo sombrio de sua gestão pública. Desta vez, o epicentro do escândalo está na Secretaria Municipal de Saúde (Sesau), onde uma denúncia robusta e repleta de evidências detalha o funcionamento de um esquema que ficou conhecido como “máfia dos plantões falsos”. A investigação, conduzida pelo Ministério Público de Mato Grosso do Sul, expõe supostos atos de fraude, pagamentos irregulares, acúmulo ilícito de vínculos e descumprimento sistemático da carga horária por parte de médicos e gestores da rede pública.
O caso chegou ao conhecimento das autoridades por meio do Núcleo de Apoio Especial à Saúde (Naes), coordenado pela promotora de Justiça Daniela Guiotti. O inquérito foi instaurado após o recebimento de um dossiê com minúcias que impressionam pelo nível de detalhamento e gravidade das acusações. As apurações apontam que médicos recebiam por plantões não realizados, ocupavam funções de chefia sem vínculo efetivo e atuavam simultaneamente em unidades públicas e clínicas privadas, sem controle de jornada. Em muitos casos, sequer havia registro eletrônico da presença, violando a resolução Sesau nº 407/2018 e a Lei Complementar nº 190/2011.

Um dos nomes centrais da denúncia é o do médico Bruno César Casal Santos. Nomeado pela Sesau em novembro de 2024 com dois contratos de 24 horas semanais, ele também ocupa o cargo de supervisor médico coordenador da Urgência. Segundo o dossiê, no dia 17 de novembro daquele ano, Bruno sofreu um acidente de trânsito e foi internado. Apesar disso, aparece oficialmente como estando de plantão naquela mesma data e horário. O fato mais desconcertante é que o próprio atendimento médico a Bruno teria sido realizado pela secretária de Saúde, Rosana Leite, que não integra o corpo clínico da Santa Casa de Campo Grande. Ainda assim, ela teria assinado o atendimento e concedido alta ao servidor, numa ação fora de qualquer protocolo institucional.
As suspeitas se aprofundam com a constatação de que Bruno recebia mensalmente por até 14 plantões, supostamente registrados na Coordenação de Urgência, setor de natureza administrativa. O volume de pagamentos ultrapassaria o teto permitido por CPF dentro da folha de pessoal da Sesau. A ocupação de cargo de chefia por um contratado temporário também viola as regras estabelecidas pela legislação vigente, que exige a efetividade do servidor para o exercício dessas funções.
Outros nomes também surgem com força na denúncia. A médica Larissa Missirian, coordenadora da Regulação Municipal, teria acumulado dois vínculos na Sesau e recebido por plantões nunca realizados. Segundo o relato, durante os turnos atribuídos à rede pública, ela estaria atuando em clínica privada. As folhas de ponto, nesse caso, seriam assinadas por Ana Paula Borges, coordenadora de Relações Institucionais, que também passa a figurar entre os alvos do inquérito.
O médico Cyro Leonardo Albuquerque Mendes, por sua vez, foi citado como beneficiário de pagamentos indevidos por plantões ao longo de 2024, enquanto exercia cargo de chefia sem vínculo efetivo. Os repasses cessaram, curiosamente, após o surgimento de denúncias internas no setor de Recursos Humanos da própria Sesau.
A investigação atinge diretamente a secretária Rosana Leite e sua equipe. De acordo com o dossiê, a cúpula atualmente responsável pela Sesau já respondia por problemas semelhantes durante sua atuação no Hospital Regional entre 2020 e 2022. Na época, a secretária, ao lado de servidores como Ana Paula Borges, Ana Paula Cangussu e Danilo de Souza Vasconcelos, foi alvo de questionamentos sobre a condução administrativa e práticas suspeitas. O atual secretário adjunto da Sesau, Aldecir Dutra de Araujo, também aparece no relatório com um histórico de condenações no Tribunal de Contas do Estado, relativas a sua passagem por outras gestões municipais de saúde.

A ausência de ponto eletrônico, a flexibilização ilegal da jornada e a falta de fiscalização estruturada são os principais facilitadores da engrenagem que teria se instalado na secretaria. Provas documentais, planilhas com datas retroativas e registros contraditórios sustentam a denúncia. Um exemplo simbólico está na planilha de plantões de Bruno César Casal Santos. O documento, elaborado em 31 de agosto, inclui um plantão atribuído a 17 de agosto, dia em que o médico estava hospitalizado. O cenário sugere a existência de manipulação deliberada dos registros.
O Ministério Público, por meio da promotora Daniela Guiotti, determinou no dia 22 de maio de 2025 o envio dos autos para as promotorias de Justiça da Saúde e do Patrimônio Público. A meta é apurar, além do descumprimento da carga horária, os indícios de improbidade administrativa, desvio de verbas públicas e responsabilidade penal dos envolvidos.
A revelação do caso gerou profunda indignação entre usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), que enfrentam filas, falta de medicamentos e unidades superlotadas. O sentimento de revolta se intensificou diante da hipótese de que verbas destinadas ao atendimento da população estejam sendo desviadas para sustentar esquemas ilegais com conivência de gestores.
A prefeita Adriane Lopes, já criticada pela condução da saúde no município, vê sua administração ser colocada em xeque mais uma vez. A permanência de Bruno César Casal Santos em cargo de confiança dentro da Sesau é uma das questões que mais geram cobranças públicas. A população aguarda um posicionamento claro e ações imediatas de responsabilização, não só dos servidores diretamente citados, mas também de quem permitiu, por ação ou omissão, a institucionalização dessas práticas.
O caso lança luz sobre a fragilidade dos mecanismos de controle na administração pública municipal e alerta para a urgência de uma reforma profunda nos critérios de contratação, fiscalização e responsabilização de agentes públicos. O Ministério Público já iniciou a coleta de depoimentos e análise de novos documentos. A expectativa da sociedade é de que as investigações avancem com independência e que os culpados sejam punidos com o rigor que o caso exige.
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