Em um país onde a confiança nas instituições é abalada dia após dia por escândalos de corrupção e fraudes, a descoberta de descontos indevidos em benefícios de aposentados e pensionistas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) mobilizou uma multidão silenciosa, muitas vezes invisível: os idosos. Desde o dia 30 de maio, mais de 488 mil segurados procuraram presencialmente uma agência dos Correios para contestar cobranças não autorizadas, somando-se a um total de mais de 3,1 milhões de contestações em todo o país
A medida, lançada para facilitar o acesso de quem tem dificuldades com tecnologia, oferece atendimento humanizado e direto, como destaca o presidente do INSS, Gilberto Waller. “É um atendimento olho no olho, presencial, em que a pessoa se sente segura. Em apenas duas semanas, já recebemos mais de 10% dos requerimentos por esse canal”, afirmou ele durante visita à agência central dos Correios, em São Paulo.
Maria Alves de Oliveira, de 83 anos, foi uma das idosas que aproveitou a celebração do dia de Santo Antônio para passar nos Correios. Sem acesso à internet e com apenas um telefone fixo, ela buscava apenas tranquilidade. “Não percebi desconto, mas vim por desencargo de consciência. Isso tudo é muito desumano. O ladrão roubando da gente que ganha um salário mínimo. Isso é duro”, desabafou.
A partir de segunda-feira, dia 16 de junho, quem já fez a contestação há mais de 15 dias úteis poderá retornar aos Correios para consultar a resposta das entidades envolvidas. Até o momento, 512 mil contestações foram respondidas com documentação apresentada por associações, supostamente autorizando os débitos. Outras 100 mil estão sendo tratadas na Justiça. O restante segue em análise.
De acordo com Waller, os dados reforçam que parte significativa da fraude foi cometida por entidades fantasmas, muitas delas fundadas em 2020 e 2021. “Elas operaram por dois anos e aplicavam valores baixos, abaixo da média de R$ 48, talvez para não chamar atenção. O que se previa inicialmente como prejuízo de até R$ 9 bilhões, pode na verdade ser em torno de R$ 1,8 bilhão, podendo chegar a R$ 2,12 bilhões com correção”, explicou.
O INSS ainda não estipulou prazo para o ressarcimento das vítimas, mas o governo já iniciou o bloqueio de bens de entidades envolvidas, somando R$ 2,8 bilhões. “Desde o início, o objetivo é que o dinheiro saia do bolso de quem lesou nossos aposentados e pensionistas”, enfatizou Waller.
No estado de São Paulo, 634 agências dos Correios estão habilitadas para esse tipo de atendimento. Em nível nacional, são mais de 5 mil unidades. O serviço é gratuito e requer apenas documento oficial com foto. Em caso de impossibilidade de comparecimento, o beneficiário pode nomear representante com procuração válida.
A operação que revelou a fraude foi deflagrada em abril deste ano pela Polícia Federal, batizada de Operação Sem Desconto. As investigações apontam que entre 2019 e 2024, cerca de R$ 6,3 bilhões foram descontados de maneira irregular, por meio de associações e sindicatos que atuavam à margem da legalidade.
Para muitos, como Luiz Alberto Ribeiro de Sena, de 70 anos, que compareceu aos Correios com dificuldades de locomoção após um AVC, a indignação é acompanhada pela esperança de justiça. “Não autorizei nenhum desconto. Isso é um roubo. Quero meu dinheiro de volta, seja quanto for”, afirmou com firmeza.
Já o aposentado Edson Conceição Santos, de 74 anos, saiu aliviado ao saber que não havia descontos em sua aposentadoria. “Conversei com o presidente do INSS e disse que meu negócio é olho no olho. Não tenho aplicativo e não quero cair em golpe”, contou.
Vinícius Moreno, superintendente dos Correios na região metropolitana de São Paulo, reforça a importância da ação. “Com um simples documento com foto, o segurado já sai da agência com o protocolo de contestação, e depois de 15 dias úteis, pode retornar para consultar a resposta”, explicou. Somente na agência central da capital paulista, quase mil atendimentos foram registrados. No estado, já são cerca de 50 mil.
A orientação final dos Correios é clara: nenhum funcionário está autorizado a ir à casa dos segurados para realizar esse atendimento. O serviço ocorre exclusivamente por meio dos canais oficiais – aplicativo Meu INSS, site do INSS, Central 135 ou agências dos Correios.
Ao mesmo tempo em que escancara uma ferida social, o caso mostra o poder da mobilização silenciosa dos aposentados brasileiros, que mesmo com limitações físicas e digitais, resistem e exigem justiça. A dignidade de quem trabalhou a vida toda não pode ser reduzida a um número de protocolo.
Como contestar descontos indevidos no benefício do INSS
- Verifique o extrato de pagamento
Acesse o aplicativo Meu INSS, o site meu.inss.gov.br ou ligue para a Central 135. Consulte o extrato de pagamento e verifique se há algum desconto não reconhecido. - Escolha a forma de contestação
Você pode contestar de três maneiras:- Pelo aplicativo Meu INSS (opção “Solicitações” > “Novo pedido” > “Contestação de desconto indevido”);
- Pela Central 135;
- Presencialmente em qualquer agência dos Correios habilitada, levando documento com foto.
- Receba o protocolo de atendimento
Após a contestação, o sistema gera um número de protocolo. Guarde este número para acompanhamento posterior. - Aguarde 15 dias úteis
Após esse prazo, retorne aos canais utilizados para verificar se houve resposta da associação ou entidade sobre o desconto. - Se necessário, nomeie um procurador
Caso o segurado não possa comparecer presencialmente, é possível nomear um representante legal com procuração válida (autenticada e específica para o caso).
Linha do tempo da Operação Sem Desconto
- Abril de 2024
Polícia Federal deflagra a Operação Sem Desconto após denúncias de descontos não autorizados nos benefícios do INSS. - Maio de 2024
INSS abre canal de contestação digital e identifica mais de 2 milhões de registros suspeitos. - 30 de maio de 2024
Início do atendimento presencial nas agências dos Correios em todo o Brasil, voltado principalmente a idosos e pessoas com acesso limitado à internet. - 13 de junho de 2025
Presidente do INSS, Gilberto Waller, visita a agência central dos Correios em São Paulo e revela que 488 mil pessoas já buscaram atendimento presencial. - 16 de junho de 2025
Data a partir da qual os aposentados que contestaram há mais de 15 dias úteis poderão consultar presencialmente as respostas das entidades.
Perfil das entidades suspeitas de aplicar descontos fraudulentos
- Origem recente e atuação digital
A maioria foi criada entre 2020 e 2021, muitas sem sede física ou atuação real. Eram entidades fantasmas com aparência de legalidade. - Valores baixos para não chamar atenção
Descontos médios inferiores a R$ 48 por mês eram aplicados para não despertar suspeitas nos beneficiários. - Operação silenciosa e disseminada
Com atuação em diversas regiões, essas entidades se passavam por associações de classe ou sindicatos que ofereciam “benefícios” genéricos. - Desdobramentos judiciais
Parte das entidades já respondeu judicialmente, e R$ 2,8 bilhões foram bloqueados em seus bens. Investigações seguem em curso. - Apuração em andamento
Mais de 3,1 milhões de contestações foram registradas. INSS e CGU acreditam que o total de lesados pode se aproximar de 4,1 milhões de pessoas.
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