Campo Grande foi novamente sacudido por um crime bárbaro que expõe, com contornos de tragédia e horror, a face mais cruel da violência doméstica e do feminicídio. João Augusto de Almeida, de apenas 21 anos, teve a prisão preventiva decretada após confessar o assassinato da própria companheira, Vanessa Eugênia, e da filha do casal, a bebê Sophie Eugênia, de apenas dez meses de vida. O caso chocou a população da capital, do Mato Grosso do Sul, e reacendeu o debate sobre a escalada da violência contra as mulheres no país.
O duplo homicídio, seguido de ocultação e destruição dos cadáveres, ocorreu no dia 26 de maio. As investigações revelaram que João, tomado por ódio e impulsionado por um sentimento de posse e desprezo, matou a companheira e a filha dentro da residência do casal, na capital sul-mato-grossense. Em seguida, transportou os corpos no porta-malas do carro e ateou fogo em ambos, num terreno localizado na região do Indubrasil.
As imagens obtidas pela polícia, provenientes de câmeras de segurança de um posto de combustíveis, mostram João comprando 13 litros de gasolina na tarde do crime. Ele aparece vestindo uma camiseta verde e conversando tranquilamente com os frentistas, sem demonstrar qualquer sinal de tensão ou arrependimento. O combustível foi utilizado para queimar os corpos, numa tentativa grotesca de ocultar o duplo homicídio.
Horas após ter cometido o crime, João registrou um boletim de ocorrência pelo desaparecimento da esposa e da filha, na tentativa de despistar as investigações. No entanto, durante depoimento prestado à Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), acabou confessando, com detalhes, a autoria do crime. O delegado Rodolfo Daltro, responsável pelo caso, destacou a frieza e a ausência de qualquer sinal de arrependimento por parte do autor.
Em seu depoimento, João relatou que o relacionamento com Vanessa era conturbado, marcado por discussões frequentes, ciúmes e comportamentos abusivos. Afirmou que odiava a filha e que, desde que a bebê completou dois meses, nutria um sentimento de repulsa por ela. Declarou, sem demonstrar emoção, que teria preferido doar a criança ao invés de continuar convivendo com ela. A motivação do crime, segundo confessou, estaria ligada à recusa em pagar pensão alimentícia. “Não vou pagar pensão para duas mulheres”, teria dito, deixando evidente o desprezo pela condição de gênero das vítimas.
O relato do criminoso também revelou detalhes que aumentaram ainda mais a indignação social e o repúdio ao ato. Segundo ele, Vanessa reclamou, no dia do crime, da compra de leite e cotonetes para a filha. A discussão teria motivado um surto de violência que culminou com o estrangulamento de Vanessa, através de um golpe conhecido como “mata-leão”. Logo depois, João se dirigiu ao quarto onde Sophie estava. Sem oferecer qualquer chance de defesa, sufocou a própria filha, que teria esboçado um sorriso ao vê-lo entrar.
O delegado Rodolfo Daltro destacou que João não apresentava sinais de transtorno mental, tampouco fazia uso de drogas ou possuía antecedentes criminais. O caso, segundo ele, reforça a constatação de que agressores não têm perfil definido e podem estar presentes em qualquer ambiente familiar ou social. “Ele tinha desprezo pela condição de serem mulheres”, declarou o delegado, enfatizando que a motivação de gênero esteve diretamente associada ao crime.
Ao ser interrogado sobre o momento em que queimou os corpos, João afirmou não ter sentido absolutamente nada. Após incendiar os cadáveres, retornou à residência e dormiu, afirmando estar exausto do trabalho. A frieza demonstrada pelo autor, segundo especialistas em criminologia, denota traços claros de psicopatia, caracterizados pela ausência de empatia e pela total desconexão emocional diante de atos de extrema violência.
Do ponto de vista jurídico, João deverá responder por múltiplos crimes previstos no Código Penal Brasileiro. A começar pelo feminicídio, que configura o homicídio qualificado cometido contra mulher por razões da condição de sexo feminino, com pena que pode variar de 12 a 30 anos de reclusão. No caso, a prática de feminicídio se dá em relação à companheira, mas também encontra respaldo para a vítima infantil, uma vez que a bebê foi morta dentro do contexto de violência doméstica e familiar, conforme estabelece a Lei Maria da Penha.
Além do feminicídio, João será enquadrado por homicídio qualificado contra a criança, com agravantes de motivo torpe e meio cruel. Também incidirá sobre ele a qualificadora do recurso que dificultou a defesa das vítimas, tendo em vista que ambas foram mortas sem possibilidade de resistência. A ocultação e a destruição dos cadáveres agravam ainda mais sua situação, configurando o crime de ocultação de cadáver, com pena adicional de um a três anos de reclusão.
Especialistas ouvidos sobre o caso defendem que João poderá ser condenado à pena máxima prevista pela legislação penal brasileira, acumulando as penas relativas a cada um dos crimes praticados. Caso não seja beneficiado por atenuantes, a punição poderá superar os 60 anos de prisão, embora a legislação estabeleça o limite de 40 anos para o cumprimento da pena privativa de liberdade.
O crime reacendeu o debate sobre o feminicídio e a violência contra a mulher no Mato Grosso do Sul, estado que lidera, há anos, os rankings nacionais de homicídios femininos. De acordo com dados da Secretaria de Justiça e Segurança Pública, o estado já contabiliza mais de uma dezena de casos de feminicídio em 2025, número que mantém a triste constância observada nos anos anteriores.
Em Campo Grande, movimentos sociais e entidades de defesa dos direitos das mulheres organizam manifestações para cobrar políticas públicas mais eficazes no combate à violência doméstica. Especialistas reforçam a necessidade de ampliação das redes de proteção e acolhimento, bem como o fortalecimento das delegacias especializadas no atendimento às mulheres em situação de risco.
O caso de João Augusto de Almeida, embora excepcional pela brutalidade, não é isolado. Ele representa uma expressão extrema de um fenômeno social que exige respostas contundentes do poder público, do sistema de justiça e da sociedade civil. A prisão preventiva decretada é o primeiro passo, mas a busca por justiça só se completará quando houver, de fato, a construção de um ambiente social que não tolere, minimize ou silencie diante da violência de gênero.
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