Mato Grosso do Sul, 6 de junho de 2025
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STF retoma julgamento histórico sobre a responsabilização das redes sociais no Brasil

Supremo Tribunal Federal debate limites da liberdade de expressão, responsabilidade das plataformas digitais e segurança jurídica no uso da internet
Foto: Hunald Vale/Rádio Senado
Foto: Hunald Vale/Rádio Senado

O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quarta-feira, 4 de junho, às 14 horas, o julgamento de um dos temas mais complexos e relevantes do cenário jurídico contemporâneo: a responsabilização das redes sociais pelos conteúdos ilícitos publicados por seus usuários. A análise gira em torno da constitucionalidade do Artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965, de 2014), dispositivo que define os parâmetros legais para a atuação das plataformas digitais no país.

O processo foi interrompido no final de dezembro do ano passado, após pedido de vista do ministro André Mendonça, que, ao devolver o caso para pauta, será o primeiro a se manifestar na sessão desta tarde. O julgamento, que poderá estabelecer um marco definitivo sobre o funcionamento das redes sociais no Brasil, opõe princípios fundamentais: de um lado, a proteção à liberdade de expressão e o combate à censura; de outro, a necessidade de responsabilização das plataformas frente à disseminação de conteúdos nocivos e criminosos.

Até o momento, três ministros já votaram, estabelecendo as bases de um debate que abrange aspectos constitucionais, sociais e tecnológicos. O presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso, apresentou voto intermediário: defendeu a responsabilização parcial das plataformas, com retirada obrigatória de conteúdos que envolvam pornografia infantil, incitação ao suicídio, tráfico de pessoas, terrorismo e ataques à democracia. Em sua visão, tais conteúdos devem ser removidos pelas empresas após notificação das partes envolvidas, independentemente de ordem judicial prévia.

Entretanto, Barroso ressaltou que, para publicações ofensivas à honra ou que envolvam crimes contra a dignidade dos cidadãos, a exclusão só poderá ocorrer mediante decisão judicial, preservando, assim, o equilíbrio entre liberdade de expressão e proteção à integridade individual.

Em posição mais rigorosa, os ministros Dias Toffoli e Luiz Fux defenderam uma responsabilização ampliada das plataformas. Para ambos, conteúdos considerados ilícitos, como mensagens que promovam ataques ao regime democrático, incitação à violência ou que contenham manifestações racistas, devem ser removidos imediatamente pelas redes sociais após notificação extrajudicial, ou seja, sem necessidade de prévia decisão judicial. Segundo eles, esta medida se impõe diante da velocidade com que conteúdos ilícitos se propagam, gerando danos muitas vezes irreparáveis à sociedade.

O julgamento envolve dois processos distintos, mas complementares, que questionam o mesmo dispositivo legal. No primeiro, relatado por Dias Toffoli, o STF analisa a constitucionalidade da regra que exige ordem judicial para responsabilizar os provedores de internet por danos causados por atos ilícitos cometidos por terceiros. O caso teve origem em recurso apresentado pelo Facebook, que busca reverter condenação por danos morais em decorrência da criação de um perfil falso na plataforma, situação que, segundo a empresa, não poderia gerar responsabilização sem que houvesse prévia ordem judicial para remoção.

No segundo processo, sob relatoria do ministro Luiz Fux, o Supremo discute a obrigação de empresas que hospedam sites na internet de fiscalizar e remover conteúdos ofensivos, mesmo sem decisão judicial. O recurso foi protocolado pelo Google, que argumenta ser impraticável exigir monitoramento prévio e permanente de todos os conteúdos publicados, sob pena de se instaurar um regime de censura incompatível com os valores constitucionais brasileiros.

As empresas de tecnologia e representantes das redes sociais, em manifestações apresentadas nas sessões iniciais, sustentaram que já realizam procedimentos internos de remoção de conteúdos ilegais de forma extrajudicial, em atenção a seus próprios termos de uso e políticas de moderação. Alegam, contudo, que a imposição legal de monitoramento preventivo comprometeria a liberdade de expressão e instauraria riscos de censura, além de afetar a segurança jurídica e a dinâmica de funcionamento da internet.

O Artigo 19 do Marco Civil da Internet, aprovado em 2014 após amplo debate no Congresso Nacional e participação da sociedade civil, buscou precisamente esse equilíbrio ao estabelecer que os provedores de aplicação e de conteúdo somente poderiam ser responsabilizados se, após decisão judicial, não tomassem as medidas cabíveis para retirar as publicações ofensivas. O dispositivo foi concebido como salvaguarda para a liberdade de expressão e prevenção de uma censura privada e arbitrária.

Contudo, a evolução tecnológica, a expansão exponencial das redes sociais e o impacto cada vez mais direto dessas plataformas sobre a vida política e social do país impuseram novos desafios ao modelo legislativo. A disseminação de notícias falsas, a utilização de redes sociais para práticas criminosas e o fomento de discursos de ódio são fenômenos que tensionam o regime atual e motivam a revisão do entendimento jurídico sobre a responsabilidade das plataformas.

A expectativa em torno do julgamento é enorme, tanto no meio jurídico quanto entre os especialistas em tecnologia e direitos humanos. A decisão do Supremo Tribunal Federal poderá alterar substancialmente o regime de responsabilidade das plataformas digitais, influenciando diretamente o ambiente de liberdade e segurança na internet brasileira.

Além disso, o julgamento acontece em um momento em que diversos países discutem ou implementam legislações mais rigorosas sobre o papel das empresas de tecnologia na contenção de conteúdos prejudiciais. Modelos como o da União Europeia, com o Digital Services Act, e o debate em curso nos Estados Unidos sobre a revisão da Seção 230 do Communications Decency Act, são frequentemente citados como referências internacionais nesse campo.

O desfecho do julgamento, que pode ocorrer ainda nesta semana ou se prolongar por mais sessões, será determinante para definir o futuro da regulação da internet no Brasil. A Corte deverá encontrar um ponto de equilíbrio entre garantir a proteção de direitos fundamentais, como a liberdade de expressão e a privacidade, e assegurar mecanismos eficazes de prevenção e combate a conteúdos ilícitos e danosos.

Independentemente do resultado final, o julgamento já se configura como um marco histórico, cujo impacto se estenderá muito além das fronteiras do Poder Judiciário, influenciando a atuação do Congresso Nacional, das empresas de tecnologia, dos órgãos de fiscalização e, sobretudo, da sociedade civil, cada vez mais consciente da necessidade de construir um ambiente digital mais seguro, plural e responsável.

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