O avanço da gripe aviária no Brasil tem provocado uma reação rápida e estratégica por parte das principais redes varejistas e atacadistas do país. Atentas ao risco de instabilidade na cadeia produtiva e comercial da proteína mais consumida pelos brasileiros, as empresas decidiram reduzir os estoques de carne de frango, antecipando uma provável queda nos preços em razão da suspensão de exportações para mais de vinte destinos internacionais.
A medida não se baseia apenas em uma expectativa pontual. O cenário atual, embora ainda controlado no aspecto sanitário, acendeu o alerta em toda a cadeia produtiva, que se prepara para as consequências comerciais da circulação do vírus. Com a interrupção temporária das vendas ao exterior, o excedente de produção deve ser redirecionado ao mercado interno, o que pressionará para baixo o preço do frango nos atacados e supermercados.
“A lógica é clara: se param as exportações, a carne fica aqui dentro. E aqui é muito difícil de haver barreiras de circulação. Com mais produto disponível, o preço tende naturalmente a cair”, explicou o diretor de uma das maiores cadeias de atacarejo do país. Ele observou que o Brasil é responsável por cerca de 40% das exportações mundiais de carne de frango, o que significa que uma mudança na logística global pode refletir diretamente no abastecimento interno.
Essa movimentação estratégica tem um objetivo específico: evitar que as redes entrem no mês de junho com estoques formados por produtos comprados a preços anteriores à retração do mercado. Manter lotes adquiridos antes da provável redução pode colocar as empresas em posição de desvantagem, com valores “fora da média de mercado”, segundo fontes do setor.
Embora a baixa dos preços ainda não tenha sido efetivada de forma expressiva nos últimos dias, as negociações entre fornecedores paulistas e compradores apontam para uma queda iminente. Especialistas em mercado de proteínas afirmam que esse comportamento é resultado do recuo das vendas ao consumidor, o que tem provocado desvalorização também em outras categorias, como carnes vermelhas e embutidos, diretamente afetadas pelo efeito dominó provocado pela carne de frango.
A percepção é compartilhada por Manoel Araújo, sócio-diretor da consultoria Martinez de Araújo e membro de conselhos de administração de redes varejistas. Para ele, o atual comportamento das redes de reduzir estoques é racional, diante da possibilidade de sobra de oferta. No entanto, ele pondera que o cenário ainda pode mudar, caso o avanço da gripe aviária provoque o fechamento de granjas e comprometa a oferta.
“Se a produção se mantiver ativa e sem paralisações, a tendência é haver um excedente. Mas se houver muitas unidades interditadas por segurança sanitária, a escassez poderá se refletir nos preços. O mercado precisa estar preparado para as duas possibilidades”, afirmou Araújo.
Em coletiva realizada na segunda-feira, 19 de maio, o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, tentou conter o pessimismo em torno do tema. Ao ser questionado sobre os impactos da suspensão das exportações, o ministro expressou confiança de que a queda nos preços não será tão acentuada e que a situação poderá se normalizar gradualmente após os 28 dias de interdição exigidos pela legislação internacional.
“Com a experiência que temos, os preços não baixaram tanto em episódios anteriores. Não acredito em uma restrição tão severa. É possível que as vendas externas retomem após o período necessário de controle”, afirmou Fávaro. O ministro também ressaltou que cerca de 70% da carne de frango produzida no Brasil já é destinada ao mercado interno, e que apenas os 30% restantes estão vinculados às exportações, o que pode minimizar os impactos em termos de oferta e demanda.
Mesmo assim, varejistas mantêm cautela. A possibilidade de reestruturação dos estoques, com novas compras feitas em condições mais vantajosas, pode gerar oportunidades comerciais relevantes. Os profissionais do setor observam com atenção o movimento de queda que se insinua, ainda que timidamente, nos canais de negociação.
Paralelamente à movimentação do varejo, autoridades sanitárias intensificam as ações de vigilância e controle nos estados do sul do país, onde há maior concentração de granjas comerciais. Até o momento, os focos registrados envolvem aves silvestres e unidades de subsistência, sem impacto relevante em escala industrial. Ainda assim, o governo federal reforça que está preparado para atuar com celeridade caso o vírus atinja estruturas de produção maiores.
A gripe aviária, causada pelo vírus H5N1, tem preocupado autoridades sanitárias no mundo inteiro, sobretudo pela sua capacidade de transmissão e pelo potencial impacto na segurança alimentar. Embora o Brasil nunca tenha registrado casos em humanos, a vigilância é constante, com protocolos de biossegurança rigidamente seguidos pelos produtores e uma rede de alerta instalada entre municípios, estados e a União.
Historicamente, a gripe aviária tem sido um fator de grande preocupação para o comércio internacional, com países importadores estabelecendo barreiras rigorosas mesmo diante de focos isolados. A suspensão preventiva de exportações, como a realizada pelo Brasil, visa preservar a reputação sanitária do país no longo prazo, protegendo o acesso aos mercados estrangeiros e evitando sanções mais severas.
Neste cenário de expectativa e adaptação, o setor varejista brasileiro caminha sobre um terreno instável, onde a prudência se mostra o principal instrumento de gestão. Reduzir estoques, reavaliar compras e acompanhar os desdobramentos da crise sanitária são atitudes que se tornaram imprescindíveis na rotina de empresas que buscam manter a competitividade e a estabilidade em meio a um cenário global de incertezas.
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