Pela primeira vez desde que deixou o cargo, o ex-presidente Jair Bolsonaro se sentará em posição de réu no plenário do Supremo Tribunal Federal, lado a lado com antigos aliados de confiança e integrantes centrais de seu governo. A audiência marcada para esta segunda-feira, 9 de junho, dá início aos interrogatórios formais dos oito réus que compõem o chamado “núcleo crucial” da tentativa de golpe de Estado investigada pela Procuradoria-Geral da República. À frente da sessão estará o ministro Alexandre de Moraes, relator do processo, em um encontro carregado de simbolismo e tensão.
O momento marca o auge de um julgamento considerado divisor de águas para a história democrática brasileira. Trata-se da última etapa antes da definição dos votos dos ministros e, posteriormente, da sentença definitiva. Os interrogatórios seguirão ordem alfabética e devem durar toda a semana. Bolsonaro, sexto da lista, deve depor entre terça-feira e quarta-feira, ao lado de generais, ex-ministros e um deputado federal que, segundo a acusação, participaram de um plano orquestrado para impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva e promover uma ruptura institucional.
O início da sessão está previsto para as 14h e poderá se estender até às 20h. O STF prepara estrutura semelhante à de um tribunal do júri, onde crimes dolosos são julgados. Os réus ficarão enfileirados no plenário, lado a lado, mas não poderão conversar entre si, conforme determinação anterior da Corte. Embora estejam proibidos de interagir, poderão fazer gestos discretos de saudação. Ao final de seus respectivos depoimentos, poderão ser dispensados, mas deverão permanecer presentes até que sejam chamados.
O primeiro a ser interrogado será o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência da República e delator premiado no processo. Cid é apontado como figura-chave na logística da suposta conspiração e deverá detalhar, sob juramento, como atuava na transmissão de ordens e mensagens entre Bolsonaro e os demais membros do grupo. O depoimento dele é considerado estratégico para a narrativa da acusação e poderá influenciar o tom dos demais interrogatórios.
Entre os acusados, estão nomes como Walter Braga Netto, general da reserva e ex-ministro da Casa Civil, apontado como possível financiador da trama; Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional; Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa; Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e então secretário de Segurança Pública do Distrito Federal no 8 de janeiro; Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência; Almir Garnier, ex-comandante da Marinha; e o próprio Bolsonaro, que segundo a PGR, era o líder da organização e orientava os passos do grupo.
A acusação central sustenta que os réus atuaram de forma coordenada para sabotar o processo eleitoral, desacreditar o sistema de votação, mobilizar forças militares e incitar um ambiente de ruptura institucional, com o objetivo de manter o poder a qualquer custo. A chamada “minuta do golpe” encontrada na residência de Anderson Torres, e os ataques às urnas promovidos por integrantes do governo, são peças centrais do processo.
As defesas dos réus, por sua vez, tentaram adiar os depoimentos alegando que não tiveram acesso completo às provas coletadas durante a investigação. O pedido, porém, foi negado por Alexandre de Moraes, que declarou que todo o conteúdo probatório já havia sido entregue às partes. A negativa reforça a disposição do relator de acelerar o trâmite processual e conduzir o caso à fase decisiva.
Sete dos oito réus respondem por cinco crimes: tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio público. No caso do deputado Alexandre Ramagem, por ter prerrogativa de foro e imunidade parlamentar, as acusações foram reduzidas a três: tentativa de golpe, abolição violenta do Estado de Direito e organização criminosa, com outras práticas suspensas por decisão da Câmara dos Deputados.
O plenário da Primeira Turma do STF estará completo para a ocasião, com a presença dos ministros Cristiano Zanin (presidente), Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Flávio Dino e Luiz Fux. A segurança do edifício do Supremo será reforçada, com controle de acesso, presença de equipes táticas e monitoramento contínuo — uma medida comum em julgamentos com alta repercussão e que envolvem autoridades.
Cada interrogado deverá responder a perguntas fundamentais para a construção da verdade processual: se conhecem os demais acusados, onde estavam no momento das infrações, o que sabem sobre os fatos imputados e se desejam apresentar alguma alegação final em sua própria defesa. Nenhum dos réus é obrigado a se autoincriminar, conforme a Constituição assegura, e podem permanecer em silêncio caso assim desejem.
A presença de Jair Bolsonaro na cadeira dos réus marca um momento de enorme repercussão política e institucional. O país assiste ao desdobramento de um processo que pode não apenas condenar indivíduos, mas definir a resposta do Estado Democrático às ameaças enfrentadas em seus pilares mais fundamentais. O desfecho dessas audiências poderá moldar o entendimento do Brasil contemporâneo sobre o limite entre a crítica política e a conspiração, entre o direito de protestar e o crime de atentar contra a democracia.
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